Nos tempos em que Scolari treinava a selecção portuguesa havia um anúncio na televisão no qual Felipão falava de palavras diferentes que encontrou quando chegou a Portugal. Os sapatos aqui não tinham cardaços, mas sim atacadores, o jogo de pembolim se chamava matraquilhos e no avião havia hospedeiras e não aeromoças.
É verdade que mesmo num país pequeno existem palavras diferentes consoante a região. Por exemplo, em Lisboa, chope é imperial e no Porto, fino. Mas a estranheza maior não está tanto na utilização de palavras diferentes, mas sim quando não as reconhecemos. Por isso o sorriso do gaúcho, no comercial, devia-se à estranheza no emprego de uma palavra que nunca tinha ouvido falar, para definir algo que lhe era tão familiar.
Porém, o mais divertido mesmo são os equívocos que geram os termos que são próximos mas cujo significado muda consoante você está de um lado ou do outro do Atlântico. Por exemplo, a torta daí é a tarte daqui e a torta daqui se chama rocambole aí. "Nossa você exagerou na pimenta", dizia-me no outro dia a Luciana ao provar o prato de caril, perdão de curry, que eu acabara de fazer. "Mas eu não coloquei pimenta, apenas malagueta", referi, com um ar inocente. “Mas malagueta é pimenta”, respondeu ela. “Não, pimenta é aquela de grão, branca, preta, etc”, ripostei (por acaso não é totalmente verdade porque, nos Açores, também lhe chamam pimenta, mas pronto). "E esse outro aí leva salsão?", perguntou ela de novo. "Não, apenas salsa e aipo", respondi. "Oi?! Salsa é salsinha? E aipo, o que é? Pois... é salsão.
Como se não bastasse a Lu me acusa de comer as vogais, mais do que qualquer outro patrício, versão que é corroborada por vários amigos meus (amigos da onça, está visto). Assim, ela adoraria que eu dissesse be-rin-ge-la ou be-te-rra-ba em vez de "brngéla", ou “btrraba”. Ou ainda queijo em vez de "qeij".
Por falar nisso, gostava ela, também, que o som desta última palavra ("qeij") se distinguisse bem de "peixe", algo que parece não acontecer frequentemente. Por exemplo, no outro dia, no supermercado, cheguei junto dela, entusiasmado, dizendo: " Lu, comprei um queijo fresco maravilhoso!". E ela: "qual, carapau?".
Crónica publicada originalmente na revista brasileira Prazeres da Mesa, em Abril 2014 (Foto: queijo fresco com pimenta da terra tirada no Mané Cigano, em Ponta Delgada, Açores)