Já não é propriamente novidade que Leonardo Pereira se prepara para assumir o comando de um novo projecto no Hotel Areias do Seixo, próximo de Torres Vedras, após quase 5 anos passados no Noma, em Copenhaga.
Contudo, enquanto o restaurante (ou o projecto) não chega, Leonardo Pereira aceitou o desafio de Ana Músico e Paulo Barata da Amuse Bouche e vai desvendar um pouco do que será a sua cozinha num jantar Origens, a decorrer no próximo dia 30, no Vestigius Wine Bar, em Lisboa.
Como é sabido, o Origens é um projecto nascido na edição deste ano do Sangue na Guelra - com o objectivo de dar a conhecer o trabalho de jovens chefes e de os incentivar a pensar "fora da caixa" - e que entretanto foi autonomizado por forma a estender-se ao longo do ano. O pontapé de saída desta nova fase deu-se com João Rodrigues (do Feitoria), cabendo agora, então, a Leonardo Pereira dar-lhe seguimento.
Em 2011, quando escrevi sobre a experiência que tive no Noma (na boa companhia de Paulina Mata, Joana Moura e André Magalhães), acabei por fazer um apontamento sobre o Leonardo - que tão bem nos tinha recebido, como é imagem de marca do Noma, e sobre quem René Redzepi me falou de forma elogiosa. Na altura não houve espaço na revista para publicar uma boa parte da nossa troca de palavras e, por isso, recupero agora uma parte dessa informação, que me parece pertinente, tendo em conta o seu regresso ao país.
Perguntava-lhe eu, a determinada altura, se pensava regressar a Portugal e que tipo de cozinha gostaria de praticar se tivesse o seu próprio espaço. Estávamos em Março de 2011...
" Não tenho por norma fazer planos a longo prazo, mas gostaria de voltar a Portugal algum dia. O que eu gostaria, e que de certa forma tem vindo a acontecer, lentamente, é que houvesse um despertar da nação, em geral, para uma alimentação mais natural, onde se valorizem produtos, não só portugueses, mas com uma ligação histórica e cultural do nosso país. Gostaria que as pessoas fossem aos mercados em força e que ajudassem as bancas de comida a distanciarem-se das de roupa de feira. Que elevassem e trouxessem os produtos de herança familiar, frutas de árvores com história e que desenvolvessem uma agricultura de forma sustentada. Gostaria ainda que houvesse melhores planos de irrigação, que se premiasse as raças de animais autóctones e que cada região se elevasse e se sentisse orgulhosa da sua tradição gastronómica. Mas, para isso, é preciso mais do que um restaurante ou uma pessoa só...
Não sei bem o que lhe dizer quando me pergunta sobre o meu tipo de cozinha preferido, visto não ter estabelecido completamente o meu próprio caminho. Creio que, do ponto de vista de quem dá, tem que ser algo que me fascine, que reflicta a minha própria entrega e paixão pela comida. E, é claro, irá basear-se largamente nas ideias pelas quais tenho passado. Creio que a beleza de comer passa, sobretudo, por não se restringir apenas a um conceito. A própria flexibilidade dos povos, a generosidade da terra e o prazer de comer constituem a espinha dorsal do meu ideal e discordo daqueles que dizem que a comida, ou cozinha de autor, é como a moda. Sim, devia ser sazonal, mas, sobretudo, intemporal."
Agora a parte da má notícia que consta no título deste post: quem quiser comprovar os postulados da cozinha de Leonardo Pereira (que, no essencial, parece-me que continuam de acordo com este testemunho de há três anos) vai ter que esperar pela abertura do seu restaurante. É que este jantar especial Origens encontra-se esgotado praticamente desde o momento em que foi anunciado. Já agora deixo um conselho aos que conseguiram mesa: o Origens não é um restaurante, por isso partam de espírito aberto, refreiem as expectativas e pensem no momento como uma experiência, uma amostra de ideias e/ou de um conceito.
Mesa Marcada apoia os projectos Origens e Sangue na Guelra.
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