Quando os primeiros sintomas da pandemia do covid-19 começaram a chegar a Lisboa, o Prado tinha reaberto há menos de um mês, depois de duas semanas de férias aproveitadas para efectuar algumas obras de beneficiação. Nos momentos seguintes, o restaurante continuou a trabalhar bem, já não com a casa cheia, mas sempre com a sala bem composta. Aliás, quando comunicaram o encerramento, a 13 de Março, tinham bastantes reservas em carteira, mas, tal como aconteceu com outros restaurantes decidiram fazê-lo para proteger a equipa e os próprios clientes.
Isto foi antes de ser decretado o primeiro estado de emergência que ditou o fecho obrigatório, a 18 de Março. Não custa adivinhar a angústia da primeira semana. Será que teremos de fechar muito tempo? Quanto tempo? iremos resistir?
Mas essas duas primeiras semanas serviram também para reflectir, para se organizarem, verificarem os apoios estatais, perceberem o que poderiam fazer e como actuar para minimizar os danos. Com toda a equipa em lay off parcial, montaram um plano e decidiram passar a fazer take away e entrega ao domicílio, não só de refeições do restaurante, mas, também, de produtos do Prado Mercearia.
Passado um mês sobre esta decisão, perguntei a António Galapito, como estavam a decorrer as coisas. “Tem dias”, afirmou o chefe do Prado, “mas a semana passada até correu bem”. “Correr bem” por estes dias significa facturar numa semana “o mesmo que facturavamos num almoço decente”. É difícil olhar para os números baseado nas referências de um passado de sucesso ainda demasiado presente, mas é preciso seguir em frente e aprender a relativizar. Galapito, refere que há dias em que não estão a ganhar o suficiente para cobrir a parte da empresa nos custos do lay off, mas se não fizessem nada seria pior. António não entra a depressões e vai a jogo. “Somos novos, é importante estarmos activos”. É que além de ser uma forma de se manterem ocupados é importante manter um contacto com os seus clientes e fornecedores e colaborar no que puderem para “manter a economia a funcionar”. A equipa também tem contribuído para ajudar a comunidade local fazendo refeições sociais com produtos que lhes são fornecidos, mas não é um assunto que queiram tirar partido.
Bom, sendo assumidamente o Prado um dos meus restaurantes preferidos e um dos que mais frequentava, pareceu-me óbvio que seria um dos primeiros a que recorreria caso decidissem começar a fazer entregas em casa. E fizemo-lo por duas vezes, uma mais no início e outra neste Sábado passado. Uma das coisas que sempre gostei no Prado foi a capacidade de Galapito e da sua equipa, que reúne vários jovens talentosos, de se reinventarem na cozinha. Há uma matriz e depois dançam ao sabor das estações e do que os produtores com quem mantêm uma estreita colaboração, vão gerando. Há sempre propostas novas na carta e pratos que vão e vêm, mas raramente regressam exactamente como eram. Até nestes menus de take away. Por exemplo, no nosso pedido mais recente, de 1 de Maio, na deliciosa salada de espargos, os brancos vinham em pickle, ao contrário do primeiro pedido, um mês antes, em que eram frescos e (pouco) cozinhados. Tem lógica. Afinal a época dos espargos brancos estava a acabar e tendo em quantidade haveria que fazer perdurá-los. A solução por este tipo de conservação pareceu-me adequada, uma vez que veio dar um belo contraste com os espargos verdes grelhados “al dente” levando o prato para outra dimensão.
Mesmo que os pratos nunca sejam iguais, como afirmei acima, era natural que num período de contingência como este aparecessem alguns “clássicos” ou top sellers. Não, não houve (nem consta que venha a haver) o tártaro de minhota, o único prato que se manteve sempre desde a abertura do Prado, mas houve os pleurotos com massa de pimentão (que é batida com manteiga) e trigo sarraceno tostado, bem como o estufado de (carne de vaca) minhota com creme de couve flor e ovo a baixa temperatura, um prato envolvente, de cozinha de conforto, de se comer à colher – e um prato ideal para ser aquecido e reaquecido se for necessário. O nosso pedido incluía ainda uma barriga de atum com um sabor mais assertivo (devido a ser uma peça com alguma cura,) onde o contraste com raspas de yuzu fez toda a diferença. Não foi o prato mais popular cá em casa, ao contrário do último, a codorniz grelhada. A qualidade, o ponto certo de cocção da ave, e, acima de tudo aquele sabor extra fizeram a diferença. Galapito explicou que à medida que vai sendo grelhada, a codorniz é pincelada com um molho que é uma mistura de manteiga com os sucos das cabeças de gambas e que, no final, ainda acrescenta um pó de carabineiro desidratado. Será necessário explicar mais?
No que toca a sobremesas, a escolha era limitada, mas como havia a do costume, o intenso e denso gelado de cogumelos, com uma porção generosa de caramelo liquido ao lado, não foi preciso mais.
Barriga de atum com yuzu; pleurotos com massa de pimentão; codorniz com molho de gambas; estufado de minhota com creme de couve flor e manteiga noisette
Para efectuar um pedido do Prado, cuja ementa é publicada 24 horas antes (em princípio vai ser disponibilizada com maior tempo de antecedência), basta aceder ao site do restaurante e seguir os passos (também é possivel comprar um gift card com desconto para usar mais tarde quando o restaurante abrir). A entrega é combinada a determinadas horas. No nosso caso, que pedimos para as 20h, tudo chegou na temperatura certa. Os pratos quentes (pleurotos, estufado e codorniz) foram deixados no forno a 50º, na própria embalagem, para manterem a temperatura, enquanto fomos comendo os tépidos: a salada de espargos e a barriga de atum.
Houve (há) ainda um detalhe que apreciei nesta opção de oferta de comida para fora do Prado, que foi o facto de tudo vir em embalagens compostáveis. Um dos aspectos que me desagrada na opção de take awayé a quantidade de plástico e alumínio descartável que sempre envolve. Pelos vistos, existem no mercado outras soluções menos nocivas para o ambiente e é bom saber que, mesmo num período difícil, o restaurante não abdica de ter uma solução de acordo com os princípios que advoga.
António Galapito não vê a hora de abrirem o Prado, mesmo com todos os condicionamentos. À partida, será no dia 21 de Maio, com uma equipa reduzida nesta fase (três pessoas na cozinha e duas na sala), somente três dias por semana (quinta, sexta e sábado), apenas aos jantares e com a capacidade limitada a 50% da lotação. Quanto à continuação do take away/delivery não sabem ainda, depende do sucesso da operação. Se conseguirem servir 25 a 30 refeições por dia é provável que deixem de fornecer esse serviço, pelo que se o leitor pretender ter esta experiência em casa, o melhor é pedir nestes próximos tempos.
Custo desta refeição, para duas pessoas: 55€
As propostas do Prado devidamente (ou mais ou menos) empratadas: salada de espargos; barriga de atum com yuzu; gelado de cogumelos com caramelo, e pleurotos com massa de pimentão
Escolha o vinho para acompanhar a sua refeição em vinhoemcasa.com, patrocinador desta rubrica, onde pode encontrar mais de 40 referências das principais regiões vitivinícolas nacionais.
Restaurante Prado:
Entregas: jantares de Quinta-feira a Domingo. Encomenda miníma de 30 euros. Custo de entrega: 2 euros.
Áreas de entrega em Lisboa:
Alcântara, Estrela, Misericórdia, Santa Maria Maior, São Vicente, Penha de França, Areeiro, Alvalade, Avenidas Novas, Campolide, Campo de Ourique, Santo António, Arroios
Fotos: a primeira foi retirada do instagram do restaurantes; as seguintes são de Miguel Pires
Patrocínio:
Post relacionados:
. A cozinha do Belmiro esteve cá em casa
. A essência do Epur esteve cá em casa
. A cozinha de Marlene Vieira esteve cá em casa
. A Taberna da Rua das Flores esteve cá em casa
. A cozinha de Vítor Sobral esteve cá em casa