Quantcast
Channel: Mesa Marcada
Viewing all articles
Browse latest Browse all 1424

A selfie de protesto de uma chefe de cozinha

$
0
0

Bel_Coelho.jpg

  

A conhecida chefe de cozinha brasileira Bel Coelho, não achou grande piada que um cliente (profissional da sua área) tenha comentado no final de uma refeição, no seu restaurante Clandestino, em São Paulo, que gostara de boa parte do menu, mas não da sua cara de sono.  Ela, que além de proprietária e chefe do lugar é mãe de duas crianças e uma activista da cozinha brasileira, respondeu no Instagram:  

 

#Selfie antes de arrancar a maquiagem me fez lembrar que essa semana ouvi dizer que tenho cara de sono. A crítica veio de um cliente do ramo da gastronomia e estava comendo o menu dos orixás dessa semana. Gostou da maior parte do menu com exceção do arroz de rabada que achou sem sal e a minha cara de sono. Primeiramente, fiquei injuriada, mas em poucos momentos notei que essa pessoa tem toda razão. Sim, devo andar com uma tremenda cara de cansada a torto e à direita. Acho que esse é ainda um direito garantido, principalmente a mulheres que trabalham pelo menos 12 horas por dia e tem dois filhos (um de 1 ano que acorda todo dia às 6 da matina e um de 4 que vem toda noite pra minha cama) para criar e educar. Além do meu trabalho normal e dos meus pequenos, me dedico também a algumas lutas que julgo importantes para transformar nosso brasil num país mais justo e democrático para meus filhos e para todos. Mas sinto em dizer que do jeito que a coisa anda, muito bem obrigada por um lado, e muito catastrófica na conjuntura política, meu ritmo não vai mudar. Vou seguir trabalhando muito, lutando e resistindo para construir um cenário mais democrático e justo em varias esferas e em todas que eu puder tocar.

 

Posso melhorar o tempero do arroz, mas a cara vai seguir assim, ora com sono, cansada, frustrada, ora maquiada, feliz e natural.

 

(Posteriormente observado: os colegas do nosso ramo são os primeiros que deveriam demonstrar empatia pelos nossos perrengues, mas infelizmente são sempre os mais animados em te tacar a primeira pedra, né, não? É assim em todo meio?)"

  

O protesto para uma maior igualdade de oportunidades das mulheres nas cozinhas não é de hoje, mas, nesta época de #metoo, são ainda mais as vozes que se levantam, sobretudo, quando há uma premiação, como aconteceu recentemente com o lançamento do último Guia Michelin de França, em que dos 57 dos novos restaurantes estrelados apenas dois tinham chefes mulheres – isto num panorama geral de 621 restaurantes estrelados em que apenas 16 são liderados na cozinha por mulheres.

 

A Michelin justifica que não olha ao género quando distingue um restaurante e mesmo nós, por razões semelhantes, nunca vimos com bons olhos a sugestão de criarmos uma categoria para mulheres nos prémios anuais do Mesa Marcada. Pessoalmente, a minha opinião não mudou muito (em relação ao prémio), porém, sou mais sensível ao assunto e reconheço que toda a comunidade gastronómica pode e deve criar melhores condições para facilitar a ascensão das mulheres nas cozinhas, sobretudo, no que diz respeito à conjugação com a vida familiar e, nomeadamente, na questão da maternidade. É verdade que estes problemas não são exclusivos das mulheres (nem desta profissão). Porém, são elas, normalmente, que estão no fim da linha. Por isso, como homem que - reconheço - tem por vezes dificuldades em colocar-se no papel de uma mulher, acho importante ser “acordado” com manifestos como este, da Bel Coelho.

 

 

#Selfie antes de arrancar a maquiagem me fez lembrar que essa semana ouvi dizer que tenho cara de sono. A crítica veio de um cliente do ramo da gastronomia e estava comendo o menu dos orixás dessa semana. Gostou da maior parte do menu com exceção do arroz de rabada que achou sem sal e a minha cara de sono. Primeiramente, fiquei injuriada mas em poucos momentos notei que essa pessoa tem toda razão. Sim, devo andar com uma tremenda cara de cansada a torto e à direita. Acho que esse é ainda um direito garantido, principalmente a mulheres que trabalham pelo menos 12 horas por dia e tem dois filhos (um de 1 ano que acorda todo dia às 6 da matina e um de 4 que vem toda noite pra minha cama) para criar e educar. Além do meu trabalho normal e dos meus pequenos, me dedico também a algumas lutas que julgo importantes para transformar nosso brasil num país mais justo e democrático para meus filhos e para todos. Mas sinto em dizer que do jeito que a coisa anda, muito bem obrigada por um lado, e muito catastrófica na conjuntura política, meu ritmo não vai mudar. Vou seguir trabalhando muito, lutando e resistindo para construir um cenário mais democrático e justo em varias esferas e em todas que eu puder tocar. Posso melhorar o tempero do arroz, mas a cara vai seguir assim, ora com sono, cansada, frustrada, ora maquiada, feliz e natural. (Posteriormente observado: os colegas do nosso ramo são os primeiros que deveriam demonstrar empatia pelos nossos perrengues, mas infelizmente são sempre os mais animados em te tacar a primeira pedra, né, não? É assim em todo meio?)

Uma publicação partilhada por Bel Coelho (@belcoelho) a

 

 


Viewing all articles
Browse latest Browse all 1424

Trending Articles