Diz-se que comemos com os olhos. É bem verdade. De facto o que vemos influencia muito a percepção do que comemos. Contudo, apenas o que vemos não é suficiente. Mas se um prato bonito souber muito bem, aí passamos para outro nível. Se além disso despoletar emoções e fizer pensar, passamos para um patamar superior. Foi precisamente isto que encontrei há dias no almoço de apresentação de pratos da nova carta e do menu de degustação do restaurante Midori. O chef Pedro Almeida começou por nos falar da sua cozinha e recente estadia no Japão, onde teve oportunidade de se familiarizar mais profundamente com a cultura, as técnicas e os sabores desse país. Mas também da dificuldade de reproduzir os pratos tradicionais noutro continente, e da nova carta que inclui recriações de pratos tradicionais e pratos de fusão, principalmente criações que associam ingrediente, técnicas e sabores japoneses e portugueses. Os novos ingredientes e técnicas culinárias são também (muito bem) utilizados, mas voltarei a este aspecto mais tarde.
Sashimi de Salmão com Puré de Ervilhas e Hortelã
Um creme de ervilha com um forte sabor a hortelã, ovas de salmão e chips estaladiços de raiz de lotus acompanhavam o sashimi de salmão.
Sashimi de Carapau com Molho à Espanhola
Sashimi de carapau sobre um disco de molho à espanhola gelificado (gel muito suave), com espuma de salsa e crocantes de semente de abóbora.
Tataki de Carapau com Tomate
O tataki de carapau vinha sobre uma fina fatia de pão frito, esta estava polvilhada com um pó de tomate (acho que liofilizado), sobre a tosta estava ainda um sorvete de tomate com dashi e mirin (que dava um doce muito suave). A tosta vinha sobre um copo com gaspacho tépido que devia ser sorvido por uma palhinha com miolo de pão torrado, conferindo assim uma componente crocante.
Tataki de Atum de Outono
Servido sobre um troco, e sendo o atum acompanhado por legumes, cogumelos, castanhas, nozes pecan, wasabi e um gel de sunomono (molho vinagre de arroz) a lembrar gotas de água.
Nigiri de Lingueirão à Bulhão Pato
Um nigiri de lingueirão, sobre uma pequena porção de molho de Bulhão Pato e um gel de yuzu.
Até aqui pratos muito leves baseados em peixe, pratos com uma componente estética bastante sofisticada. Os pratos seguintes seriam de carne, com uma estética bem mais rústica. Penso que o facto do prato que se segue introduzir uma nota de humor e ir muito directo às nossas memórias gastronómicas, conseguiu fazer uma transição para o último prato que não se sentia como demasiado abrupta.
Ramen de Barriga de Porco com Ovo a Baixa Temperatura
O prato “pesado” da refeição, as noodles frescas, ali confeccionadas, a barriga de porco cozinhada a baixas temperaturas durante 24 horas, macia e suculenta, o ovo, cozinhado a 65ºC, bem cremoso, mas que não se espalhava no caldo quando partido, a textura perfeita!
O Pedro Almeida começou por empratar as três sobremesas como são servidas normalmente. Cada uma com uma grande variedade de componentes.
A nós serviram-nos uma sobremesa, que incluía as três, em miniatura.
Diamantes de Pêra Nashi - Yuzu, Maracujá e Manga - Esféricos de Chocolate, Lima e Wasabi
Mousse e caramelo de pêra, pérolas de shisô e gelado de pêra; Panacota de maracuja, yuzu e kalamansi cremoso, manga e gelado de yuzu e bergamota; Esferas de chocolate com geleia de wasabi e lima e gelado de wasabi. Muito bonitas, muito leves, muito boas. Muito coerentes com o resto do menu. A sobremesa esteve à altura dos restantes pratos! E isto significa muito… Um óptimo final para uma excelente refeição, que começou com uma sakerinha e foi toda acompanhada com uma cerveja Pilsner artesanal, produzida para a Unicer para o Midori.
Pratos esteticamente irrepreensíveis, lindíssimos e muito saborosos. Mas gostava de destacar a forma como o Pedro Almeida utiliza as novas técnicas de cozinha. Não para fazer show-off, mas porque conferem um valor acrescentado ao prato. A esferificação de laranja sanguínea permite introduzir este sabor de uma forma que contribui para a estética do prato e permite incluí-la na apreciação do prato como e quando queremos. Houve pessoas que quiseram introduzir na boca a esfera inteira, para mim fez mais sentido rebentá-la e ir molhando a enguia e o foie no molho.
Já a esfera de dashi com o edamame, só fazia sentido ser introduzida na boca inteira, ao rebentar sentia-se primeiro o sabor umami do dashi que cobria a língua, e enquanto ainda o sentíamos, mastigávamos o edamame com um sabor e textura bem diferentes.
As variadas espumas, que introduzem sabores bem definidos de uma forma muito leve. De salsa, de cerveja...
Os géis de molho à espanhola, yuzu, sunomono, ou no revestimento de uma mousse de pêra na sobremesa (obtendo-se o que chamavam uns cristais de pêra)… Que permitem uma textura diferente, que vai determinar a intensidade da percepção de sabor, o momento dessa introdução (se fosse um líquido era muito diferente) e contribuir para a componente estética.
As cozeduras a baixas temperaturas, as desidratações…
Aplicações muito inteligentes, com objectivos muito definidos, e que contribuem de várias formas para o valor do prato.
E ainda há quem tente desvalorizar estas técnicas e diga que passou, que faz perder a identidade, que é copiar…
Tinha estado no Midori em Maio, voltei agora, fiquei com a sensação de que o Pedro encontrou uma linha de trabalho própria, porque havia uma grande coerência nas propostas apresentadas, apesar de muito diferentes. Mas notei também uma grande evolução. O Pedro, a continuar assim, vai certamente ter muito que dizer na cozinha de influência japonesa em Portugal.
Contactos:
Midori - Penha Longa Resort - Estrada da Lagoa Azul Sintra - Linhó 2714 - 511 Portugal
T: +35 1 21 924 9011