Começa amanhã, prolongando-se pelo fim de semana, numa das praças mais feias e sem sentido de Lisboa, o Figueira Marca-te, uma iniciativa da Associação de Dinamização da Baixa Pombalina, com apoio da Câmara Municipal de Lisboa, com 25 bancas a venderam muitos produtos frescos. Prevê-se que a iniciativa se repita noutros fins de semana.
Mas porque é que a Praça da Figueira é tão feia e sem sentido, a ponto de os turistas, quando lá desembocam nos seus passeios na zona, voltarem para trás? Porque é quando olhamos para ela, nos parece que falta qualquer coisa? Porque em 1949 decidiram demolir o mercado que ali tinha sido construído em 1885, com estruturas em ferro, para ali porem…nada, a não ser uma estátua equestre de D. João I (já em 1971), da autoria de Leopoldo de Almeida.
Era esse o nosso verdadeiro mercado central, comparável à Boqueria, de Barcelona, ao Covent Garden, de Londres, ou ao recém-recuperado Mercado de San Miguel, de Madrid, e a tantos outros que existem nos centros históricos das cidades europeias. O Mercado da Ribeira, que se espera seja recuperado um dia, sempre ficou um pouco afastado e mais vocacionado para restaurantes e profissionais do sector, cumprindo a função que hoje o MARL tem.
Já há algum tempo que defendo que o Mercado da Praça da Figueira deveria ser reconstruído, tanto mais que me dizem que ainda existem restos das estruturas em ferro no Parque da Serafina, em Monsanto (ainda não fui procurá-las) e certamente muitos documentos e fotografias (como algumas que reproduzo aqui) que permitiriam uma reconstituição fiel, ainda que o mercado me pareça que agora deveria ter outras valências e horários, mais adaptados aos hábitos actuais da população e dos turistas.
No ano passado, apresentei a proposta no Orçamento Participativo da Câmara de Lisboa, sem qualquer êxito ou sequer resposta.
Creio que um mercado com esta centralidade, para mais numa zona em que não existem centros comerciais, daria um enorme impulso à revitalização da Baixa e mesmo da Mouraria, muito mais do que não sei quantos “planos” que já se fizeram para esta parte da cidade, que aliás está a ter cada vez mais procura em termos de habitação e de estabelecimentos hoteleiros, incluindo hostels. E, atraindo visitantes, beneficiaria restaurantes e lojas da Baixa.
Comparando com 1949, tem hoje a vantagem de possuir um parque de estacionamento subterrâneo e estação de metro. Quanto à estátua que lá está, poderia ser facilmente removida para outro ponto da cidade.
Eu sei que os tempos não estão para grandes gastos públicos, mas talvez, tal como aconteceu com o mercado de San Miguel, em Madrid, a iniciativa privada pudesse ser atraída para o projecto. Aqui fica a ideia, mesmo que tenha pouca esperança de a ver concretizada. Mas não seria interessante ver Lisboa começar a recuperar, em vez de destruir, algumas das características que fazem parte da sua longa história?
Termino este post com uma citação de Fernando Pessoa no guia "Lisboa, o que o turista deve ver", escrito provavelmente em 1925, agora editado pela Livros Horizonte: "A dois passos a Leste do Rossio, descobrirá a Praça da Figueira, que é o mercado central de Lisboa e está construído num local outrora ocupado pelo Hospital de Todos os Santos, pelo Convento de São Camilo e por outros edifícios. Este mercado é muito popular e animado; é de ferro, com uma cobertura de vidro, e é composto por um grande número de pequenas lojas e quiosques, voltados para a rua ou para o interior do edifício. A melhor altura para o ver é de manhã, em que ele nos oferece um espectáculo animado."