Tinha cerca de 20 anos, era o primeiro estágio depois do curso na Escola de Hotelaria de Lisboa e estava num “restaurante de luxo” na capital. Mas as coisas não corriam nada bem. “Detestei aquilo, até pensei desistir de ser cozinheiro”, lembra. Salvou-o uma indicação de um amigo, que lhe disse que no Furusato, no Tamariz, no Estoril, precisavam de gente. Estávamos em 1990 e a cozinha japonesa era então quase completamente desconhecida em Portugal e também para Paulo Morais (na foto da esquerda, nos tempos iniciais, e, na da direita, nos dias de hoje), que mesmo assim decidiu experimentar. No entanto, foi uma espécie de amor à primeira vista, já que, após quatro anos nesse restaurante pioneiro, nunca mais quis outra coisa, transitando depois para o então recém-aberto Midori, na Quinta da Penha Longa, e para vários outros restaurantes sempre de cozinha japonesa e de outros estilos orientais.
Hoje, Paulo Morais, aos 48 anos de idade, é um dos mais conceituados chefes portugueses de cozinha japonesa e oriental, tendo no Kanazawa, em Algés, o seu principal restaurante, dando também aulas na Escola de Hotelaria do Estoril. Sempre com a cozinha japonesa a guiá-lo, como aprendeu com o chefe Kido Koro, no Furusato. “Julgo que foi a precisão, a seriedade com que os produtos eram tratados, que me vez enveredar pela cozinha japonesa”, afirma. Porém, não se julgue que neste processo de aprendizagem tudo foi fácil. “A tarefa que me custava mais era descascar camarões crus. Eram toneladas todas as semanas...”, recorda. E não bastava só tirar-lhes a casca, era preciso ir mais além. “Tínhamos também que tirar a tripa sem os estragar, deixando-os imaculados, porque iam ser usados em tempura e no sushi”, recorda. O chefe japonês promovia competições entre os cozinheiros para ver quem se saía melhor e a verdade é que Paulo Morais aprendeu rapidamente e bem. “Nunca consegui ser tão bom quanto ele, mas o que me ensinou ficou-me para o resto da vida. E não foi só descascar camarões...”
Nota: Nesta rubrica, perguntamos a chefes experientes qual a tarefa ou prato que tiveram que executar até à exaustão no início das suas carreiras e que até hoje conseguem realizar “de olhos fechados”.
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