Um salto à Madeira como enviado da revista Up da TAP para reportar a primeira etapa da 3ª edição Rota das Estrelas, o evento que ao longo do ano reunirá chefes de cozinha portugueses e estrangeiros 'estrelados' nos restaurantes nacionais distinguidos pelo guia Michelin. O Ill Gallo d'Oro, do hotel Cliff Bay, abriu as hostes e logo com um programa de 4 jantares divididos em duas semanas. O Duarte Calvão esteve num dos jantares da primeira leva, como já aqui escreveu, e eu, no terceiro da última semana. Tal como o Duarte, aproveitei também a curta estadia de dois dias para visitar outros dois lugares: o popular Santo António, em Estreito de Câmara de Lobos e o Uva, o restaurante fine dining do hotel The Vine, no Funchal.
Rota da Estrelas - Cliff Bay/ Il Gallo d'Oro
Benoît Sinthon do Il Gallo d'Oro e Miguel Vieira do Costes (Budapeste)
Começo pelo fim. Tinha cá estado no ano passado e, agora, após estes dois dias, noto que o evento, ou pelo menos esta etapa, está em crescendo. O trabalho que tem vindo a ser efectuado pela equipa do Porto Bay (o grupo hoteleiro proprietário do Cliff Bay) trouxe frutos e não só houve uma maior presença da imprensa (regional, nacional e internacional - generalista e especializada), como a sala do Il Gallo d'Oro esgotou durante os 4 dias do evento e com mais de metade de clientes pagantes. Aliás, segundo a organização o número de clientes interessados daria para encher o restaurante praticamente todos estes dias. Este é talvez o maior mérito desta equipa local: conseguir passar uma imagem da Madeira como um destino gastronómico, quer ao nível do fine dining das 'estrelas', quer ao nível dos seus restaurantes mais populares, ou ainda, como montra dos produtos de excelência da ilha: vinhos, frutas, legumes, carne e peixe. Este festival, e em especial esta etapa, tem ainda o mérito de permitir a troca de experiencias entre as equipas e a motivação que esse intercâmbio traz, sobretudo, aos profissionais que aqui trabalham e cujo contacto com outras realidades é menor do que no continente. Estão de parabéns, portanto, António Trindade e Jan-Erik Ringertz, Fabíola Pereira (e a sua equipa de marketing e comunicação) e, last but not the least, o Chef Benoît Sinthon.
Quanto a jantares colectivos de Chefs, partilho da opinião do Duarte. Quando não são bem planeados funcionam mais como uma soma de personalidades do que como um todo. No entanto, talvez porque a maior parte dos chefes presentes nesta etapa já tem uma boa rodagem nestas coisas, houve um menu coerente e as pessoas presentes tiveram oportunidade de conhecer uma amostra das suas cozinhas, sem atropelos ou dissonâncias de maior.
Deixo de seguida algumas notas em relação aos pratos do jantar em que que estive presente, o penúltimo que reuniu o Chef da casa, Benoît Sinthon e os Chefs convidados, Erlantz Gorostiza (MB- Martin Berasategui, Tenerife, Espanha), Vincent Farges (Fortaleza do Guincho), Aimé Barroyer (Tavares, Lisboa), Miguel Vieira, (Costes, Budapeste, Hungria), Yves Michoux (Chef pasteleiro da casa).
O jantar abriu com uma Ostra crocante com sumo iodado e caviar cítrico, de Erlantz Gorostiza. Apresentação simples num conjunto de sabores frescos e envolventes - gostei particularmente do contraste e da textura do granizado de toranja.
Surpresa de foie gras, puré de alcachofras e trufa, mini legumes marinados de Benoit Sinthon. Assustei-me um pouco com a quantidade de elementos deste prato mas a harmonia reinou entre pares. (a loiça é que não ajuda muito às fotos. Ou a utilização de uma máquina diferente. Ou o jeito)
Bodião Salteado com funcho do mar, legumes da quinta e vinagrete de botarga, de Vincent Farges - um prato que faz parte da nova carta da Fortaleza do Guincho, só que em vez de rascasso, aqui, foi apresentado com um peixe mais comum na Madeira, o bodião (também conhecido por veja, nos Açores). Sou um adepto incondicional da cozinha deste francês, do seu rigor e da forma eximia como retira o melhor dos melhores produtos e de como os conjuga, como aconteceu neste prato.
Ostra plana, salmonete do fundo, cherovia, oxalis, de Aimé Barroyer. Aimé é conhecido por gostar de trabalhar com produtos portugueses menos comuns. O salmonete do fundo é mais um deles a juntar à lista. Só foi pena que neste agradável conjunto o peixe tenha sido um pouco ofuscado pela ostra. Já agora os interessados poderão encontrar salmonete do fundo na banca da Açucena Veloso, no Mercado 31 de Janeiro, ao Saldanha (só aparece de vez em quando e que não se procure uma cor rosada. Ele é cinzento).
Porco preto alentejano da cabeça aos pés, de Miguel Vieira. Este conceito de prato, em que se apresenta partes de um ingrediente base de diversas formas e texturas, continua muito em voga. Quando resulta bem, como foi o caso, é normalmente um dos que se destaca de um menu. Da bochecha de porco Miguel Vieira fez uma bolinha panada. Ao seu lado colocou uma parte da entremeada e outra do cachaço (creio). Em frente uma espécie de bolo ópera de morcela e maçã. A contrastar e a dar alguma leveza ao conjunto folhas e talos de acelga e puré de aipo bola. Como ouvi numa mesa ao lado...damn good!