Um dos aspectos mais positivos do bom momento que a cozinha criativa está a viver em Portugal é vermos cada vez mais chefes com possibilidade de praticarem a cozinha em que acreditam. Por vezes em projectos próprios, apoiados por sócios discretos, outras vezes integrados em grupos de restauração, frequentemente em hotéis que passaram a apostar na gastronomia como factor diferenciador das suas unidades. O hotel da Penha Longa, em Sintra é, já há alguns anos, um bom exemplo desta última vertente. Mais conhecido ultimamente pela aposta que fez na consultoria do chefe espanhol Sergi Arola (cada vez mais “português”, já passa por cá bastante tempo), há uns três anos tiveram a feliz ideia de autonomizar um espaço para uma cozinha mais elaborada, a que chamaram Lab, chefiada pelo chefe residente Milton Anes, e rapidamente se tornaram numa referência, ostentando já uma estrela Michelin (não seria de estranhar que a segunda viesse nos próximos anos), enquanto o resto do restaurante Arola mantinha um perfil mais informal e direcionado para famílias.
Pois bem, a verdade é que este hotel começou por ser pertença de um grupo nipónico quando foi inaugurado no final dos anos 90 e distinguia-se pelo seu restaurante Midori, uma das pouquissímas opções de cozinha japonesa então existentes em Portugal, chefiado pelo bem conhecido Paulo Morais (hoje no Rabo d´Pêxe, em Lisboa). O Midori passou depois pelas mãos de vários outros chefes, mas nos últimos anos foi Pedro Almeida quem assumiu a casa, mostrando um estilo próprio, conciliado com técnicas e ingredientes japoneses, criando outro tipo de pratos que conviviam na carta com o habitual sushi-sashimi, tão do agrado dos clientes.
Acontece que agora a direcção do hotel, numa mudança parecida com que aconteceu com o Arola e o Lab, decidiu autonomizar essa parte mais criativa do Midori num espaço próprio, que manteve o nome, apenas com 18 lugares, enquanto o restante espaço está destinado a um novo restaurante “pan-asiático” (sobretudo cozinha japonesa, chinesa, tailandesa e indiana), que ainda não tem nome, mas onde continuarão a figurar os clássicos japoneses, inclusive no famoso buffet de sábado à noite, herdeiro do das noites de quarta-feira do tempo de Paulo Morais, de grande êxito.
Foi a este novo e menor Midori que fui nesta semana a um jantar de apresentação da nova carta à Comunicação Social. Foi ocasião de ver Pedro Almeida à solta, seguindo o figurino do longo banquete kaiseki, mas com muitas referências a sabores bem familiares aos portugueses e aos europeus em geral, desde tomate, flor de courgette, pimentão, alho e coentros até enchidos, manteiga ou ameixa de Elvas, em pratos onde o mar predominou com muitos peixes e mariscos portugueses, com destaque para o carapau, de que Pedro Almeida é especial apreciador.
Pargo curado em algas e essência de mar
Nas fotografias estão alguns dos pratos apresentados (na de abertura, tataki de carapau com tomate crocante e gaspacho), mas, não querendo ser exaustivo, gostaria de destacar alguns dos meus favoritos, começando pelo couvert Hassum, constituído por kinuta de santola de Cascais, tofu com percebes, telha de tapioca com carapau e gengibre, cabeças de camarão fritas com plâncton e aioli de yuzu, telha crocante nori com toro, gema de ovo, cebolada, caviar e ponzu, espargo com kimizu e óleo de farinheira. Bem curioso o miso shiro de caldo verde (na última foto), embora tivesse gostado de sentir mais a presença da couve, excelente a tempura de lavagante em flor de courgette e sete nigiri perfeitos, inclusive pelo óptimo arroz. No fim, um único prato de carne, mas era logo de wagyu japonês...
Sashimi de salmonete com folhas, molho de manteiga e miso
Claro que esta originalidade e qualidade tem um preço e não é, nem pode ser, barato. Há um menu de nove “momentos” que fica em 95 euros por pessoa, outro de 11, que fica em 160 euros. Quem quiser a harmonização com vinhos e saké, paga, respectivamente, mais 30 ou 40 euros, ficando nas mãos da escanção norte-americana Andrea Smith, há quase dez anos em Portugal. Se não se for pelos menus, há nigiri bem interessantes a 11 ou 12 euros e outros pratos mais caros. Não há dúvida de que é uma aposta com uma dose de risco elevada, como já o fora o Lab, mas julgo que valerá a pena, porque é uma cozinha cheia de personalidade num ambiente agradabilíssimo com um chefe que, aos 35 anos, parece estar cheio de vontade de mostrar o muito que vale.
Abre de terça-feira a sábado, só para jantar. Tel. 219 249 011