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Renovado Mercado da Ribeira abre finalmente

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No próximo dia 18 de Maio, quatro (ou cinco) anos após ter ganho o concurso do Município de Lisboa, para a reabilitação do Mercado da Ribeira, a revista Time Out abre finalmente este emblemático mercado de Lisboa. 

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Para já trata-se "apenas" da zona de restauração do piso térreo ficando para mais tarde o piso superior que terá "um restaurante, um bar, uma loja, um espaço de turismo e uma sala multiusos onde todas as secções da revista serão amplamente refletidas", segundo o comunicado enviado à imprensa. 
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A parte agora a inaugurar parece bastante ambiciosa e promete mexer ainda mais com uma das zonas de maior dinamismo da capital (sobretudo em termos de animação nocturna), o Cais do Sodré. 
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São vários os nomes conhecidos com espaços no Mercado da Ribeira, como os chefes Alexandre Silva, Miguel Castro Silva, Vitor Claro, Marlene Vieira e Henrique Sá Pessoas. Além deles estarão também algumas das lojas emblemáticas, como a Conserveira Nacional a Manteigaria Silva e Garrafeira Nacional, de Lisboa, ou outras de fora (alguns já com lojas na cidade) como a Arcádia, Santini e Monte Mar. Marcam igualmente presença espaços mais recentes, que têm feito sucesso, como o Sea Me, Prego da Peixaria, Honorato, ou Pizza a Pezzi. Ao todo serão 30 espaços espalhados por 3000 metros quadrado e servidos por 500 lugares sentados em área coberta e mais 250 de esplanada. 
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Nota-se pelos nomes escolhidos - a que se juntam ainda marcas como a UnicerJoão Portugal Ramos, Sumol/CompalDeltaVista Alegre e Renova - que houve um critério de selecção de forma a dotar os espaço de personalidade própria e assim evitar que se tornasse uma praça de restauração igual à de qualquer centro comercial.  
 
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Este conceito segue uma tendência internacional dos últimos anos e segue um principio semelhante ao de espaços como os mercados do Bom Sucesso (no Porto) e de Campo de Ourique (também em Lisboa). Contudo parece-me muito mais ambicioso e com mais nomes de peso associados. Percebe-se pelo desenho e pelos nomes envolvidos que se pretende ter uma representação da cidade, ao estilo do que a revista tem ajudado a divulgar: da cozinha de autor à popular; da mercearia tradicional a espaços contemporâneos; do prego ao sushi criativo, do hamburger gourmet ao pastel de nata. 
 
Para o director da Time Out, João Cepeda, “esta será a primeira fase de implementação de um projecto editorial a 3 dimensões nunca antes feito no mundo. Numa altura em que a aposta dos meios é totalmente virada para as novas tecnologias, a Time Out Lisboa decide criar o desafio de se transformar num espaço e deixar de ser só uma marca de culto em papel".
Este é sem dúvidas um projecto que muito valoriza a cidade, o Cais do Sodré e um espaço emblemático que definhava há muitos anos, já para não falar da sua importância na economia da cidade, do investimento privado que envolveu (5 milhões de euros) e dos 300 postos de trabalho directos criados. No comunicado não é avançado se foi procurada alguma solução para a parte de mercado existente anteriormente, onde, na verdade, pouco mais existia do que meia dúzia de bancas interessantes. 
 
Após a inauguração do próximo domingo serão vários desafios que se colocam na cidade com a abertura deste renovado Mercado da Ribeira. Entre eles destaco dois. O primeiro prende-se com a repercussão que o Mercado da Ribeira vai ter na restauração local: haverá lugar para 30 novos espaços a abrir em simultâneo? Como se irá reflectir este impacto no Cais do Sodré e nos bairros vizinhos (Bairro Alto, Chiado, Santos)? Irá o Mercado de Campo de Ourique ressentir-se?  A segunda questão prende-se com a própria Time Out. Como tratará editorialmente este seu espaço uma revista que muito se gaba de ser a única a avaliar "regularmente os melhores restaurantes da cidade, de forma totalmente anónima e independente"? 
Posto isto resta dar as boas vindas a este novo polo de atracção gastronómica, aos seus promotores e aos espaços e pessoas envolvidas nele. Como autor deste blogue e como cidadão, agradeço. 

 

 

Horário de funcionamento - Time Out Mercado da Ribeira:

Dom-Qua: 10.00-00.00 ; Qui-Sáb: 10.00-02.00 (a partir de dia 18 de Maio) 


Já abriu o renovado Mercado da Ribeira

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A partir deste domingo é este o cenário que poderá encontrar no renovado Mercado da Ribeira, em Lisboa, um projecto liderado pela revista Time Out e que teve inauguração oficial ontem.

 

O essencial sobre a nova vida deste espaço emblemático de Lisboa pode ser lida no post anterior. Aqui apenas deixo as primeiras impressões após a a visita na concorrida inauguração (ilustrada na foto). 

 

Gostei bastante do que vi em termos de decoração e disposição do espaço. Existe uma uniformização arquitectónica, nomeadamente ao nível das cores (com predomínio do preto e branco) e dos materiais, sem impedir que cada restaurante tenha podido personalizar os seus espaços respeitando determinadas regras. Depois há uma área enorme de mesas, o que me parece acertado dado que esse é normalmente o maior problema deste tipo de espaço (veja-se o caso do Mercado de Campo de Ourique ou até mesmo o de San Miguel em Madrid). Ontem a inauguração aberta apenas a convidados foi um bom teste para ver como se comporta o espaço em dias de casa cheia, como os que se esperam nos próximos tempos. E a verdade é que se circula bem e, parece ser relativamente fácil de conseguir mesa, até porque há esplanada no exterior, já para não falar no jardim público também renovado numa das laterais. 

 

Ontem foi igualmente possível provar a oferta dos vários restaurantes e similares presentes. Contudo, embora tenha provado um pouco de tudo, nem sempre era fácil descortinar de onde vinham por isso não vou tecer grandes considerações neste post. Adianto apenas que quem frequenta habitualmente o Peixe em Lisboa vai encontrar algumas semelhanças, pelo menos, em relação aos chefes/restaurantes que costumam marcar presença. Como referi no inicio para saber mais sobre as características do Mercado da Ribeira e dos restaurantes presentes leia o post anterior (aqui).

 

 

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Chega de hambúrgueres ou o "O Livro das Sanduíches", segundo Hugo Nascimento

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#chegadehambúrgueres, lê-se na sobrecapa do livro de receitas de sanduíches de Hugo Nascimento, lançado ontem na Tasca da Esquina, em Lisboa. Num mundo ideal, um bocadinho mais sofisticado, esta poderia ser uma óptima capa principal para o livro, mas provavelmente alguém teve receio que a mensagem ficasse por descodificar e deu-lhe uma capa mais evidente e um título mais directo: "O Livro das Sanduíches".

 

O Hugo Nascimento é um chefe talentoso que só não é mais conhecido porque nunca deu o último passo. Há 20 anos que trabalha com Vítor Sobral, sendo há muito tempo seu sócio e braço direito. "Por vezes, as capacidades técnicas, criativas e humanas do Hugo nem sempre lhe são reconhecidas individualmente, mas sim ao grupo de que faz parte", escreve Vítor Sobral no prefácio do livro. Porém, Hugo Nascimento parece-me tranquilo com o seu lugar e não é por falta de talento ou personalidade que ainda não deu o salto, como pudemos ver no jantar dos 'abaunilhados' que a Paulina Mata aqui bem descreveu. 

Regressando ao livro e ao falso título, que funciona como teaser. #chegadehambúrgueres, mais do que um protesto em relação à moda das rodelas de carne picada, o hashtag pretende ser uma provocação de alguém que quer ir contra a corrente. Apesar de enraizada e até mesmo banalizada na nossa cultura, segundo o autor, o tema sanduíche estava por explorar em termos editoriais, no mercado nacional. Vai daí surge então este livro bem apresentado e ainda melhor fotografado, por Nicolas Lemonnier.

 

A obra reúne 50 receitas - todas com direito a uma breve explicação e uma ou outra dica - e está dividida em 3 partes, que correspondem a 3 tipos de sanduíches: simples ("para aqueles que não gostam de cozinhar, mas gostam de comer"), Sofisticadas ("para quem gosta de arriscar e descobrir a arte da cozinha" e Clássicas ("que marcam presença nos convívios entre amigos"). Numas e noutras explora-se o pão em sentido lato, ou seja: da baguete à francesa, ao pão alentejano, passando pelo wrap, bolo do caco ou o pão de forma - em versão aberta (fatia recheada) ou fechada (recheio entre duas fatias). 

 

O que gostei neste livro do chefe Hugo Nascimento é que mesmo quando simples as receitas nunca são simplórias. Por exemplo há uma sanduíche de sardinha em conserva (com cebola roxa e iogurte), mas também há outra em que ensina a fazer conserva caseira de atum. Por outro lado, o Hugo também sabe que há sempre um cromo (como eu) que vai querer fazer a mais complicada que houver e, por isso, inclui no seu livro uma de cabeça de xara ("de confecção simples, mas demorada") que implica fazer uma terrina com meia cabeça de porco. De igual modo, existe ainda uma outra, de pato confitado, em que embora o chefe diga que se "pode sempre recorrer a produtos pré-preparados", aconselha a fazer a receita de base, já que as 4 a 6 horas de cozedura "compensa pelo resultado final". 

 

Neste conjunto de receitas há influências e inspirações de todo lado: da sanduíche de mortadela do "Mercadão" de São Paulo, à de gravlax dos nórdicos ou à de omelete enrolada dos japoneses. Contudo, como seria de esperar, a maior parte remete para a cultura portuguesa e para memórias de infância, como a sanduíche de marmelada com manteiga, um must para quem já foi criança (e não só). Ah! e entre as 50 receitas #háumhamburger, o tuna burger.  

 

 

"O Livro das Sanduíches", de Hugo Nascimento, Oficina do Livro ; 180 páginas; Preço de capa: 16,60€ 

 

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Jantar no Belcanto celebra "10 Preferidos" do Mesa Marcada

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Custou, mas foi. Ao fim de quatro anos de prémios “Os 10 Preferidos”, o Mesa Marcada vai finalmente promover o primeiro jantar, aberto ao público, para celebrar quem mereceu a preferência do nosso painel de cerca de 80 jurados. A iniciativa vai decorrer na próxima segunda-feira, 2 de Junho, no Belcanto, em Lisboa, que este ano ficou em primeiro lugar da escolha de restaurantes e quem cozinha é José Avillez, também primeiro na lista dos chefes. O jantar custa 100 euros por pessoa, incluindo vinhos da Idealdrinks, principal patrocinadora dos “10 Preferidos”, e constará de um menu especialmente preparado para a ocasião, em que haverá pratos novos mas também “clássicos” de José Avillez, que já tinha conquistado a preferência do painel de jurados em 2012 com o Belcanto e o primeiro lugar nos restaurantes em 2010, com o Tavares. E também nos vinhos da Idealdrinks se espera a apresentação de novidades. Para que este jantar seja ainda mais especial, José Avillez receberá, às 20h, os convidados no seu novo espaço no Chiado, o Mini Bar (Rua António Maria Cardoso, 58, no Teatro São Luiz), a dois passos do Belcanto, para um cocktail de boas vindas (com snacks Mini Bar) seguindo-se depois para o restaurante preferido do painel Mesa Marcada, totalmente reservado para esta iniciativa, onde decorrerá o jantar, que inclui cinco pratos. Quem quiser participar pode ligar, até quinta-feira, para o Belcanto, tel. 21 3420607.

 

Fotografia: Paulo Barata

 

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A gastronomia em festa

José Avillez prepara-se para abrir o restaurante Mini Bar no Chiado

 

Guias Michelin São Paulo e Rio só em 2015

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Afinal, os chefes e proprietários de restaurantes brasileiros vão ter que esperar até Março do ano que vem para saber como o Guia Michelin classifica os seus estabelecimentos. Ontem de manhã, o director mundial do guia, o norte-americano Michael Ellis (na foto), deu uma conferência de Imprensa em São Paulo para anunciar que só nessa data serão publicados os guias das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, os primeiros da América Latina. Ficam assim esclarecidos os rumores que previam que a Michelin lançaria o guia ainda antes do Campeonato do Mundo de Futebol, que levará muitos turistas ao Brasil em Junho. Mas os inspectores já estão no terreno e, segundo Ellis, "falam português", o que quer dizer pouco já que, pelo que se sabe, não há brasileiros nem portugueses nas equipas. Mas o director do guia afirma que estão a ser preparados inspectores brasileiros para trabalhar no guia. Já não é mau, porque para o guia de Portugal eles não recorrem a portugueses.  

 

Fotografia: uol comidas e bebidas

 

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Os pratos e os vinhos do jantar Mesa Marcada no Belcanto

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Já estão esgotados os lugares para o jantar que celebra os “10 Preferidos” do painel de jurados do Mesa Marcada, que vai decorrer na próxima segunda-feira no Belcanto, em Lisboa. As nossas desculpas a quem não conseguiu inscrever-se a tempo, mas esperemos que haja “celebrações” futuras a que possam ir. Como tínhamos dito, o chefe José Avillez preparou um menu especial onde apresenta pratos novos, um clássico (o leitão revisitado, na foto) e uma nova versão do seu trabalho com cavala. Aqui fica o menu, com os vinhos da Idealdrinks, principal patrocinador dos “10 Preferidos”, que também apresentará dois tintos novos para acompanhar o leitão. Assim, após o cocktail no Mini Bar, o novo espaço de José Avillez no Chiado, o jantar inicia-se, já no Belcanto, com espumante Colinas Rosé Reserva, seguindo-se duas entradas: torricado de cavala em escabeche e "Cozido à Portuguesa" (vinho Principal Rosé 2010). Depois, “pataniscas" de bacalhau com samos de coentrada, ovo e tomatada (vinho Eminência Loureiro 2010) e leitão revisitado (dois tintos novos). Por fim, citrinos e doces de ovos (espumante Colinas Brut Reserva). Fica prometido que daremos aqui notícias de como correu.


Fotografia: Paulo Barata


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Restaurante moderno

Alentejo e o seu importante património gastronómico

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Rebuçados de Ovo (foto de Mário Cerdeira)

 

Se me pedissem para destacar o que acho mais distintivo na nossa cozinha, nem tinha que pensar. Referiria imediatamente a doçaria conventual e a forma muito própria como usamos o arroz (nós que somos os maiores consumidores de arroz da europa  com um consumo anual per capita de 16 Kg, enquanto que o resto dos países europeus andam pelos 4-5 Kg). Mas falemos da doçaria conventual, criada numa época em que a maioria das mulheres nos conventos não estavam ali por fé, mas sim por imposição social, e a quem sobrava todo o tempo do mundo para se dedicarem a fazer doces. O tempo ajudou, mas a associação de muito engenho e arte permitiu-lhes desenvolver e optimizar muitas receitas a que deram frequentemente nomes relacionados com a vida conventual ou a fé católica. A variedade é grande, a lista de ingredientes é curta. Basicamente açúcar, ovos (sobretudo gemas – já que as claras era usadas para clarificar o vinho ou engomar) e amêndoas, a que esporadicamente se juntam outros como doce de chila ou folha de obreia (que estava mesmo ali à mão…).

 

A necessidade levou a que estes doces passassem a ser vendidos nas redondezas dos conventos para lhes reforçar os orçamentos e, mais tarde, com a extinção das ordens religiosas, a sua venda era uma das fontes de sustento das freiras. Assim, técnicas e segredos foram passando para outras mulheres, que as transmitiram de geração em geração. Esta forma de transmissão não garante contudo a preservação deste conhecimento inestimável e é urgente em muitas situações encontrar outras vias.

 

Em Portalegre, cidade conhecida pela “cidade dos sete conventos”, a doçaria conventual tem uma grande expressão. Muitas destas receitas foram sendo confeccionadas pela família Cardoso, que tinha uma amiga que fora educada num convento e que lhes transmitiu receitas e técnicas. Dado que as gerações mais recentes da família tomaram rumos de vida diferentes, para manter este extraordinário legado, a Câmara Municipal de Portalegre e a Região de Turismo de S. Mamede levaram a cabo, há alguns anos, uma acção de formação onde a última doceira da família ensinou os seus segredos. Entre o grupo a quem foram transmitidos estes saberes estava Rosária Maria, que continuou a aprimorar os seus conhecimentos e abandonou a profissão de cabeleireira, para se dedicar a 100% à doce, mas exigente, actividade de confeccionar doces conventuais.

 

Uma impressionante mesa de doces conventuais ocupava o centro da sala de jantar do restaurante Terraço do hotel Tivoli no jantar de apresentação da semana de divulgação da cozinha do Alentejo, que decorreu de 13 a 21 de Maio. Evento integrado no projecto "Portugal de Norte a Sul"  que decorrerá durante os anos de 2014 e 2015, e trará ao restaurante Terraço, no Tivoli Lisboa, cozinha das várias regiões de Portugal. Só foi pena não haver oportunidade de podes disfrutar de tudo o que estava naquela mesa durante um período mais longo, é que os doces conventuais são excelentes, mas requerem um consumo comedido…

Lampreia
Leite Serafim

Havia doces que desconhecia completamente e com características bastante originais. Destes achei particularmente interessantes o Leite Serafim, a Lampreia, os Fartes e o Manjar Branco. Este, à base de farinha de arroz e leite (e não dos ingredientes habituais na doçaria conventual), distingue-se de outros doces com o mesmo nome de outras regiões pela composição e, sobretudo, pela apresentação em pequenos gomos que são retirados à mão, o que permite uma forma de consumo muito convivial e até lúdica.

 Manjar Branco

Neste evento a cozinha esteve a cargo do José Júlio Vintém, que após um período do outro lado do Atlântico, está em fase de preparação da abertura do seu Tomba-Lobos (a 10 de Junho), tendo regressado à sua localização inicial. Os pratos foram acompanhados por vinhos da Herdade da Calada.

(Foto de Mário Cerdeira)

 

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Lisboa movimenta-se

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É provável que já tenham reparado que nos últimos meses apareceram em Lisboa alguns "restaurantes" sobre rodas, numa aproximação, ainda que tímida, ao conceito dos food trucks de que muito se fala (e faz sucesso) nos Estados Unidos - com direito até a um filme: o "Chef", de Jon Favreau, estreado recentemente por cá. Confesso, pelo que espreitei, que ainda não vi nada ainda de muito excitante made in Portugal. Contudo, ontem, quando vinha da apresentação do pop up que a Bulldog gin fez com a Schweppes no espaço Embaixada, no Príncipe Real (fica até final de Junho e é mais um lugar para os apreciadores de gin tónic com direito a esplanada, petiscos e uma sala interactiva com algumas acções engraçadas) chamou-me à atenção duas pequenas lambretas estacionadas à entrada do Jardim Botânico, na Rua da Escola Politécnica.

 

Na verdade o que me chamou à atenção foi mesmo foi o anúncio de que se vendia cerveja artesanal. Este movimento interessa-me bastante e - tal como o dos food trucks - começa a ganhar expressão também por cá. Até aqui a produção artesanal de cerveja estava toda (ou quase toda) concentrada de Coimbra para cima, como acontece com os casos da Maldita, Praxis, Letra ou Sovina - este último, é aquele que me parece ser o projecto mais maduro, com maior expressão e qualidade. A sul só conhecia a do meu amigo (e escritor) Afonso Cruz, que entre livros e ilustrações faz de vez em quando umas cervejas em casa - isto quando as leveduras não resolvem fazer greve ou reacções estranhas ao clima alentejano. Mas desta vez é mesmo uma cerveja feita em Lisboa, na Calçada de Santana, e a que foi dado o nome de Sant'Ana LX Brewery (assim mesmo, em inglês, como o Duarte Calvão gosta - ainda por cima próximo do seu habitat :).   

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O Lisboa on Wheelsé um dos parceiros de venda desta cerveja e tem (ou pelo menos tinha ontem) neste espaço algumas das suas referências: uma Porter (escura) uma APA (American Pale Ale), uma IPA (India Pale Ale - o meu estilo preferido) - todas em garrafa - e ainda uma "blonde"à pressão. Provei a blonde e gostei mas achei mesmo mais interessante o amargor refrescante da IPA.

 

Para além destas cervejas artesanais o Lisboa on Wheels, que tem à frente o casal o Hugo e Vera (na foto), vende apenas mais 3 ou 4 produtos: o pastel de nata da Biarritz (que ficou em 2º lugar no concurso do melhor Pastel de Nata de Lisboa 2014), umas empadas, café, água e pouco mais. É pouco? é, mas é um bom começo e original (sobretudo na parte das cervejas). As peculiares lamberetas têm ainda a companhia, no projecto, de uma pão de forma (a popular carrinha da VW dos anos 60). Como todos os veículos são móveis, eles andam aí, em "Lugares selectos", como se diz em linguagem comercial. Bom, pelo menos, para já, estão à entrada do Jardim Botânico de 3F a Domingo das 10h às 18h. 

Notas soltas

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Hoje janto com um pé atrás…Aqui está um jantar recomendo com prudência, porque eu próprio não sou grande entusiasta destas partes “menos nobres” ou miudezas (talvez “offal”, como vem descrito, soe melhor para algumas pessoas…), mas a verdade é que lá estarei esta noite no Midori, na Quinta da Penha Longa (Sintra), sobretudo porque me habituei a apreciar coisas que normalmente não gosto quando feitas por bons chefes e Pedro Almeida está nesse nível. E também admiro a originalidade e o gosto pelo risco que demonstra. O menu fica em 59 euros (sem bebidas) e consta de tiradito de tamboril com os seus restos e citrinos, nigiri de língua de vaca com tomate e alecrim, tataki de coração com umeshu, kinuta de bexiga de bacalhau, língua e outros sabores a mar; yakitori de tendão com maçã e azeitona; tempura de patas de frango com milho (na foto, de divulgação), gyoza de caril de cristas de galo, linguado com rim e teriyaki, crocante de pele e suriyaki de cascas; caroço e casca de banana com pimenta sancho. Adivinho que vou gostar mais do “offal” de peixe do que o de carne, mas vamos deixar acontecer.

 

 

Coitados do concorrentes a Master Chef…Este já aconteceu, foi ao almoço e recomendo sem hesitações. Mas devo dizer que fiquei com pena dos concorrentes do Master Chef (programa da TVI) que num dos episódios, que não tive oportunidade de ver, tiveram que reproduzir estes pratos do chefe Pascal Meynard, do Ritz Four Seasons Lisboa: cocotte de lavagante com legumes da estação e trufa preta, lombo de vitela rôti com sementes de abóbora, batata recheada com alho francês e trufas negras e taça de caramelo e café, gelado de chocolate, tartelette de “capuccino”. Mesmo para profissionais não deve ser fácil, quanto mais para amadores…Único senão, as trufas pretas, que na época das gravações estavam no auge e agora devem ser congeladas. Quem quiser provar, por 65 euros, tem até dia 18 de Junho, e ainda leva de graça o espectáculo dos jacarandás em flor na Rua Castilho, mesmo em frente a este esplêndido hotel.

 

 

Ricardo Costa sem mãos a medir. Não se pode ir a todas e por isso tenho pena de não estar “À Mesa com os Chefes” esta noite no The Yeatman, em Vila Nova de Gaia, jantar com que se inicia a etapa da Rota das Estrelas deste excelente hotel e restaurante nortenho. Fica em 95 euros, com vinhos incluídos, com o anfitrião Ricardo Costa a receber quatro outros estrelados: Michel van der Kroft (T Nonnetje, Harderwijk, Holanda), Miguel Vieira (Costes, Budapeste), José António Campoviejo (Corrral del Indianu, Astúrias) e Jordi Esteve (Nectaria, Barcelona). Amanhã, o programa prossegue com uma “Festa na Cozinha” (ou “Kitchen Party”, para quem não fala português), onde vai ser difícil caberem tantos chefes: Ricardo Costa, Michel Van der Kroft, Miguel Vieira, Benoît Sinthon (Il Gallo D’Oro, Funchal), Marlene Vieira (Avenue, Lisboa), Henrique Sá Pessoa (Alma, Lisboa), Paulo Morais (Umai, Lisboa), Rui Costa (Marbela, Esposende) e Miguel Gameiro (Lisboa). Fica em 110 euros, com vinhos. Grande final, na noite de sábado, com Ricardo Costa, Dieter Koschina (Vila Joya, Albufeira), Erlantz Gorostiza (duas estrelas no MB, em Tenerife) e o célebre Juan Amador, chefe alemão de origem espanhola que conquistou três estrelas Michelin no seu Amador, na Alemanha. Fica em 200 euros por pessoa, com vinhos. E parece que Juan Amador virá também a Lisboa no domingo, para cozinhar na Tartar-ia, restaurante do Vila Joya no sensacional e recentemente renovado Mercado da Ribeira. A ver vamos.

 

 

O Marquês de Pombal é que sabia. Sou consumidor dos vinhos da Quinta do Gradil (Cadaval) que a bons preços apresentam belos brancos como o Viosinho e sobretudo o Verdelho, este último óptimo no tempo quente, com a sua acidez elevada e pouco álcool (11,5%), a acompanhar, por exemplo, peixes como sardinhas e cavalas. Por isso, vou estar atento à nova gama Castelo do Sulco, que, sempre pela mão do enólogo António Ventura, está direccionado para um consumo mais quotidiano e descontraído. Há um branco (Arinto e Moscatel-graúdo) e um rosé (Touriga Nacional, Syrah e Tinta Roriz), ambos de 2013, e um tinto 2012 (Touriga Nacional, Aragonez e Castelão), todos a preços que, segundo o produtor, deverão variar entre os 3 e os 3.5 euros. Por mais um euro, há o Tinto Reserva 2012 (Touriga Nacional, Syrah e Tinta Roriz), com três meses de estágio em barricas de carvalho. Nada como experimentar, porque a Quinta do Gradil tem fama de produzir bons vinhos desde o século XV e terá pertencido ao Marquês de Pombal, homem que reconhecidamente sabia da coisa.

 

 

E a Alexandra Prado Coelho é que sabe. A nossa amiga e superjornalista Alexandra Prado Coelho poupou-me ao trabalho de descrever o jantar Mesa Marcada que decorreu no Belcanto na segunda-feira passada, porque ele está impecavelmente bem relatado, como sempre, aqui, no seu Mais Olhos Que Barriga. Devo só acrescentar que fiquei particularmente satisfeito em verificar como continua a haver uma criatividade sensata e uma busca permanente por consistência por parte de José Avillez e da sua equipa. No prato de cavala, creio que nunca vi este menosprezado peixe brilhar tão alto, nas “pataniscas” com tomatada, tudo harmonioso e saboroso, num prato novo com diversos elementos. No “cozido”, outra novidade, mais uma vez sabores magníficos e bem interpretados do original, faltando, apenas, na minha opinião, a imprescindível couve, que estaria no caldo, mas não notei. E também faz falta cromaticamente. O leitão, que já revisitei algumas vezes, atingiu a perfeição absoluta, e a sobremesa de citrinos com doces de ovos a revelar também a tal “complexidade harmoniosa” de outros pratos. Quanto aos vinhos da Idealdrinks, tenho para mim há vários anos que é impossível Carlos Lucas não fazer vinhos bons ou muito bons e está tudo dito. Roubo também à Alexandra Prado Coelho, o desenho que ela reproduziu da talentosíssima Fernanda Lamelas fez da nossa feliz mesa, entre outros que podem ser vistos aqui.

 

O Regresso da Quinta das Tecedeiras

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Anteontem tive o prazer de escutar o Tony Smith e o Carlos Lucas falarem da Quinta das Tecedeiras, um projecto que se perdera na notoriedade de outras apostas da Dão Sul e que foi adquirida há pouco tempo pelo primeiro - o inglês mais brasileiro de Portugal - associado ao brasileiro Marcelo Lima. Antes já tinham recuperado os vinhos de culto da Quinta da Covela, na região dos Vinhos Verdes, às portas do Douro, e agora querem fazer o mesmo com este projecto do Douro, a que volta a estar ligado, como enólogo, Carlos Lucas, ex-CEO da Dão Sul e actual da Ideal Drinks.

O pretexto, que decorreu no Bistro 100 Maneiras, em Lisboa, foi o lançamento do Flor de Tecedeiras, o vinho de gama média da marca (com PVP previsto abaixo dos 10€) que segue a (boa) tendência actual - pelo menos nos meios mais ligados à gastronomia - de privilegiar a expressão (equilibrada) da fruta em detrimento da madeira (este nem a vê) ou a concentração alcoólica (13,2% - longe dos 14.5/15% das modas de um passado recente). Além deste vinho foi ainda apresentado um Porto Special Reserve (estilo tawny) estagiado segundo o método "solera" (utilizado em fortificados como o Jerez e Madeira) e do qual foram engarrafadas apenas umas centenas de garrafas. 

 

 sardinhas com molho de iogurte, coentros fritos e migas, a proposta de Ljubomir Stanisic que acompanhou o Flor de Tecedeiras 

 

Estes vinhos bem como um belo, ainda vivo e com personalidade reserva 2003 e um LBV, ambos desta quinta, estiveram à prova juntamente com um menu preparado por Ljubomir Stanisic. A conjugação esteve a um nível muito bom: das sardinhas com molho de iogurte (e companhia) a acompanhar o Flor de Tecedeiras, passando pelo borrego (costeleta e lombo) com crosta de pistáchios, com o Quinta das Tecedeiras Reserva ou os queijos servidos com conta, peso, medida e muita qualidade (o Amarelo da Beira Baixa em raspas, era de ir às lágrimas!) com o LBV.

 

 

 O equilíbrio foi o mote deste encontro no Bistro 100 Maneiras. Refiro-me não apenas aos vinhos, mas também à refeição, à conjugação entre ambos e à apresentação. 

Um vintage do ano da seca

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É nestas ocasiões que ponho à prova a minha capacidade de reconhecer bons vinhos. Não de os descrever “organolepticamente” ou de explicar de forma aprofundada porque gosto deles, mas tão simplesmente perceber se os vinhos são maus, banais, razoáveis, bons, muito bons, extraordinários…Se, para mim, valem o preço que se pede por eles. Estávamos na sala do restaurante Feitoria, no hotel Altis Belém, onde depois iríamos almoçar, mas antes a família Symington deu-nos a provar seis vintages da lendária Quinta do Vesúvio (na foto, de divulgação), das décadas de 1990 e 2000, que culminaria com a apresentação do mais recente, de 2012, e de outro vintage do mesmo ano, mas da Dow’s Quinta da Senhora da Ribeira. A sala estava repleta de craques da prova de vinhos e, após escrever num papel o ano daquele que, de entre os seis iniciais, mais tinha gostado, desafiei dois peritos sentados na minha vizinhança a dizerem-me qual o que tinham gostado menos. Tal como esperava, o que tinha sido mais ao meu gosto era aquele que mais lhes desagradara…


O vinho em questão tinha sido o primeiro a ser provado, de 1994, e achei-o rico de aromas, complexo e elegante, sem aquela doçura esmagadora que encontramos em tantos vintages menores de idade. Pronto a ser bebido, como diria o enólogo Charles Symington, que capitaneava a prova, o primeiro lote que ele tinha feito para a casa. Seguiram-se os de 1995, que estranhamente (na minha modestíssima opinião) ainda precisa de uns anos, apesar da pouca diferença que fazia do meu preferido, o de 2000, claramente “jovem” de mais para ser bebido, um 2004 muito mais equilibrado e subtil, um 2007, o primeiro que recebeu a designação de “Capela do Vesúvio”, e um 2009, ambos para mim impossíveis de avaliar provavelmente pela sua juventude.


Charles Symington explicaria que estes seis tinham sido seleccionados por serem de anos secos ou muito secos, tal como o que seria apresentado, de 2012, que recordamos bem por ter sido um Inverno literalmente sem chuva. A ponto de várias videiras morrerem. Quando a chuva chegou, já na Primavera, o solos, segundo o enólogo, estavam tão secos como se estivéssemos no pino do Verão de um ano normal. Pois bem, perante a minha pouca predilecção por vintages novos, tendo em conta o que tinha achado dos que tinha provado de anos mais recentes, estava preparado para o pior quando o 2012 foi finalmente servido. Qual nada, gostei imenso, tanto do Vesúvio quanto do Senhora da Ribeira, jovens sim, mas elegantes, e já se bebem com muito agrado, embora mantenha a minha perspectiva de que este tipo de vinho precisa de umas décadas em cima até estar pronto. A má notícia é que para o mercado português há apenas cerca de 600 garrafas de cada, ficando as 2.400 restantes (de cada) para os mercados externos, sobretudo Inglaterra, EUA, França e Bélgica, para onde os Symington exportam mais. Os preços previstos em Portugal são de 65 euros (Vesúvio) e 75 euros (Senhora da Ribeira) e valem bem o que se pede por eles, sobretudo para quem tem condições de os guardar em boas condições.


Terminada a prova, fomos para a mesa, para um almoço preparado pelo chefe João Rodrigues, de uma simplicidade sofisticada a que ele nos está a habituar, sempre com grande solidez nas harmonias de ingredientes e pontos de cozedura. Constava de um carabineiro do Algarve com suave salada de pepino e o seu tártaro, que foi acompanhado pelo branco Altano 2013, muito interessante e de preço extremamente acessível, e por um borrego (estranhamente, no menu estava escrito cabrito…) de leite alentejano, puré de cenoura, laranja e gengibre, legumes da Quinta do Poial, com tintos Pombal do Vesúvio e Quinta do Vesúvio, ambos de 2009, que não me deixaram grande memória, mais uma vez talvez devido à juventude. À sobremesa, um dos casamentos mais felizes da gastronomia mundial, queijo Stilton com porto vintage, este da Quinta dos Malvedos 1965, espectacular na sua potência e concentração, a mostrar o bem que faz a passagem do tempo a estes vinhos. Ah, e também consultei mais três peritos que estavam na minha mesa, escrevendo de novo o meu ano favorito entre os vintages provados. Bem, a verdade é que ninguém disse que 1994 era o melhor, mas também ninguém disse que era o pior. Já serve de consolo. Ver www.symington.com

 

Offal Dinner - Aventura à Mesa

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Foto DAQUI

Offal - o termo significa literalmente "off fall", ou seja as partes que caem de uma carcaça quando é desmanchada. Originalmente a palavra aplicava-se principalmente às entranhas. Agora cobre estas, incluindo coração, fígado, pulmões e todos os órgãos abdominais, e também as extremidades: caudas, pés e cabeças, incluindo o cérebro e língua.* Em português, é difícil traduzir, usamos miudezas, mas temos que concordar que não é um bom termo para dar nome a um jantar. O desafio a que o Pedro Almeida e a sua equipa se propuseram foi de organizar um jantar usando estas partes menos nobres dos animais. Escolheram chamar à refeição “Offal Dinner” até pela semelhança sonora com “Awful Dinner”, o que possivelmente será o que um jantar como este é para muita gente. De facto, se analisarmos o nosso receituário popular, os exemplos do uso das ditas miudezas são abundantes, sempre se comeram todas as partes dos animais que se matavam. No entanto, mais recentemente, e sobretudo num contexto urbano, em que podemos escolher as partes do animal que adquirimos, foi-se perdendo o hábito de consumir “offal”. E se algumas partes ainda se consomem, outras estão quase ausentes dos nossos pratos, até porque lembram demasiado a sua origem, coisa que às vezes preferimos esquecer.

Na generalidade são partes muito nutritivas, algumas muito ricas em proteínas, mas cujo gosto e textura depende muito do órgão e animal de onde provêm. Algumas partes têm sabores fortes, outras quase neutros, mas em geral têm texturas características, estaladiça nuns casos, gelatinosa noutros. E esta é uma textura muito apreciada no oriente, mas não tanto no mundo ocidental. De facto alguns dos comentários à mesa referiam-se a uma certa repulsa causada por alimentos gelatinosos.  

Quanto a mim achei o desafio para participar no “Offal Dinner” no restaurante Midori irrecusável. Deixou-me logo em grande expectativa. Até porque, por razões várias, sempre, e em particular em criança, comi bastante estas partes dos animais e em grande variedade. Talvez por isso as aprecie bastante. Depois, as experiências que tenho tido com a cozinha do Pedro Almeida têm sido bastante interessantes, e sempre num crescendo, e tinha uma enorme curiosidade de ver como ia apresentar estas partes dos animais, num contexto base de cozinha asiática, com as influências da cozinha e sabores com que cresceu (a nossa cozinha e sabores).

No início da refeição foi-nos dito que tinham decidido levar o desafio ainda mais longe e não servir vinho à refeição, mas combinar cada prato com uma bebida ou um cocktail diferente. A sequência da refeição foi a seguinte:

Saké aromatizado com gengibre

Tiradito de tamboril com seus restos e citrinos

Saké aromatizado com gari (o pickle de gengibre usado no sushi) o que lhe dava um aroma de certa forma floral, complementado com cardamomo, pimenta rosa e zimbro

Tamboril muito fresco, acompanhado pelas suas guelras fritas (textura muito estaladiça), a pele cozinhada num dashi (caldo japonês com uma forte componente umami), ficando assim muito saborosa e com uma textura bastante gelatinosa, molho do fígado e, para conferir frescura, laranja sanguínea, tangerina, um ligeiro toque de bergamota e yuzu e folhas de capuchinha.

Muito bom e fresco, um começo suave que aliviou algumas ansiedades e deixou a generalidade dos presentes mais confiantes para os restantes desafios.

Gin Mare

Onigiri de língua de vaca com tomate e alecrim

Um gin obtido, para além dos ingredientes tradicionais, com azeitona, manjericão, tomilho e alecrim, que lhe conferem um aroma muito mediterrânico. Destaca-se o alecrim, aroma este que fazia a ponte para o prato, também com sabores mediterrânicos e aromatizado com alecrim.

O onigiri é umbolinho de aroz japonês, geralmente em forma de triângulo, com vários tipos de recheio e envolto por uma folha de nori. Neste caso o recheio era de língua de vaca estufada e, em vez da alga nori, os bolinhos estavam envolvidos com um filme de tomate. O prato era complementado com tomate desidratado e molho de tomate. Uma estética muito oriental, um sabor muito familiar, que nos transportava para a infância.

Estávamos na nossa área de conforto… o que se seguiria? Para mim o prato mais difícil.

Sumo de arando com wasabi e hortelã

Tataki de coração com umeboshi

Um cocktail não alcoólico que foi bastante apreciado. Um porto seguro que nos aliviava da “dureza” do que veio de seguida…

Coração de porco, cozinhado a baixa temperatura e bem rosado, com um forte sabor a ferro (bem característico do sangue) e beterraba – em caviar e em cubos - com uma vinagrete salgada e ácida de umeboshi (conserva de ameixa).  E como não há coração sem sangue, ele lá estava no prato (mas, felizmente, falso! um sumo de beterraba).

Depois desta dose de “violência” era essencial um momento de calma, de suavidade. Foi o que se seguiu.

Saké aromatizado com manjericão e alga kombu

Kinuta de bexiga de bacalhau, língua e outros sabores a mar

Kinuta é o nome de um rolo sem arroz, este tinha por fora pepino e era recheado com lírio e língua de bacalhau em tempura, como acompanhamento tinha estaladiços de sames (bexiga natatória do bacalhau). Tudo isto complementado com sunomono (conserva) de wakame e uma espuma de kombu para conferir um toque umami, complementado pelo toque umami também presente na bebida. Um prato muito suave, uma suavidade que soube muito bem…

Havia apenas uma parte do animal que eu nunca tinha comido e que esperava ansiosamente. Veio a seguir, apresentada de uma forma muito “natural” e óbvia. Um prato de que gostei muito.

Vodka Grey Goose La Poire, na pipeta uma limonada fresca

Gyoza de caril de cristas de galo

A bebida com um forte sabor a pêra acompanhava uma gyosa, cozinhada primeiro a vapor e depois no teppan (chapa), recheada com um verdadeiro caril japonês de galo com arroz. Sobre ela legumes e a crista do galo, cozinhada em caril, com uma textura bastante gelatinosa, tudo complementado com um molho muito ácido com óleo de sésamo. Um prato excelente.

Saké Premium

Tempura de patas de frango com milho

O saké servido num "copo" de pepino acompanhava as patas de frango, que foram inicialmente cozinhadas num dashi aromatizado com pipocas e depois fritas – uma tempura recoberta de pipocas. Acompanhavam-nas uns fragmentos de uns estaladiços de milho e o molho característico da tempura (tentsuyu) aromatizado com pipocas e milho.

Gosto muito de patas de frango, e como-as frequentemente na canja ou em restaurantes chineses, gosto particularmente da textura gelatinosa. Aqui esta perdia-se um bocado com a cobertura estaladiça. Gostei de experimentar esta versão, foi uma forma completamente nova e inesperada de comer patas de frango.  E continuámos nas texturas gelatinosas...

Chá de limão fresco

Yakitori de tendão com maçã e azeitona

O tendão foi bem cozinhado e coberto com uma crosta de panko e mostarda. Foi servido com um puré de maçã salpicado de azeitonas.

Sumo de toranja com uma bola de melancia

Linguado com rim e teriaki, crocante de pele e suriyaki de cascas

Os rins foram cozinhados, juntamente com cogumelos shiitake e várias cascas de legumes (offal vegetal), em sukiyaki (num fondue japonês, num caldo com molho de soja e mirim). Em seguida legumes, cogumelos e cascas foram envolvidos com véu de porco (a gordura rendilhada que cobre os órgãos internos) e servidos com o filete de linguado, um pouco do caldo do sukiyaki e a pele do linguado crocante.

Chegando às sobremesas o desafio, na mesma linha era um pouco mais  difícil, foi assim ultrapassado recorrendo a alguma imaginação.

Caroço e casca de banana com pimenta sancho.

Uma ganache flexível de chocolate. Banana caramelizada e uma falsa casca confeccionada com puré de banana.

 

Um desfio muito interessante, as "estrelas da refeição" foram utilizadas de forma bastante original, o resultado promoveu muita interacção entre os participantes no jantar. Alguns pratos não regressaram vazios, mas em geral todos tentaram ultrapassar as barreiras e os preconceitos.

O acompanhamento das bebidas foi também um excelente desafio. Todas elas boas, combinações com os pratos que nem sempre foram consensuais, mas que promoveram a discussão à mesa. A maior dificuldade, segundo o Pedro Almeida, foi contudo conseguir reunir todos os estranhos ingredientes necessários. Alguns dos quais exigiram pedidos de autorizações especiais, como foi o caso das cristas de galo.

 

Parabéns ao Penha Longa Resort por permitir e incentivar estas aventuras gastronómicas e ao Pedro Almeida e toda a sua equipa pelo desafio a que se propuseram e a forma como o ultrapassaram. Um desafio original e uma aposta ganha.

 

Tentad@? Este “Offal Dinner” vai ser repetido uma única vez, no dia 27 no restaurante Midori - Penha Longa Resort.

 

 

* Alan Davidson, The Oxford Companion to Food, Oxford University Press

 

 

Contactos:

Midori - Penha Longa Resort - Estrada da Lagoa Azul Sintra - Linhó 2714 - 511 Portugal
T: +35 1 21 924 9011

 

 

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Midori – cozinha de influência japonesa 

 

 

Merecia Melhor Sorte

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Em Outubro de 2004 estive no Salone del Gusto do Slow Food em Turim. Lá encontrei stands de dois produtos portugueses, a Flor de Sal, que  se tinha tornado famosa, e que já conhecia, e um outro produto que desconhecia, o Chouriço Mirandês. Aliás esta representação de Portugal foi referida no DN (talvez pelo Duarte Calvão, não me lembro e não está assinado).

Nela o Chouriço Mirandês é assim referido:

“Os 40 ou 50 produtores da cooperativa Carne Mirandesa que ainda o fazem foram «descobertos» pelo Slow Food, que custeou todas as despesas de deslocação a Turim. Ficaram no espaço Presidia. E foi um êxito entre os visitantes, apesar de, devido à escassez da produção e da época do ano, só o terem para prova e não para venda. Servido grelhado, despacharam 15 quilos numa só hora de degustação...”

Este chouriço foi incluído na Arca dos Sabores do Slow Food que tem como objectivo chamar a atenção e contribuir para a preservar produtos que considera, pelas suas características, pertencerem às culturas, história e tradições deste planeta em que vivemos.

Provei o Chouriço Mirandês na altura em Turim, e ficou-me na memória. Pela raridade e pelo sabor diferente. Por isso quando, há uns anos, vi numa grande superfície uma embalagem de chouriço com uma foto de uma vaca imediatamente compreendi do que se tratava.

Foram sentimentos mistos que me invadiram, nessa altura e nas várias vezes em que o tenho comprado depois disso. De facto é bom poder disfrutar do Chouriço Mirandês sempre que me apetece, até porque é um chouriço com características diferentes das de todos os outros. Mas é com alguma tristeza que vejo um produto como este “perdido”, entre inúmeros outros, num balcão de uma grande superfície, sem qualquer destaque ou referência às suas características especiais e ao facto de ser um dos poucos produtos incluídos na Arca dos Sabores do Slow Food. Tenho pena que não lhe tenha sido dado o devido e merecido destaque por outros intervenientes do panorama gastronómico nacional. Por vezes parece-me que estão sempre a redescobrir o que já está descoberto. E o resto?

 

O Chouriço Mirandês merecia melhor sorte.  Não acham?

A cozinha do mundo passa pela Mouraria a partir de quinta-feira

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É já nesta quinta-feira que começa na Cozinha Popular da Mouraria (Rua das Olarias, 5 ) um festival dedicado às Cozinhas do Mundo, em parceria com a Lisboa Mistura, que até dia 28 de Junho vai levar cozinheiros de diversas origens a este simpático e original espaço que a fotógrafa e gastrónoma Adriana Freire abriu há cerca de ano e meio. Cabe ao luso-sérvio Ljubomir Stanisic dar início ao festival trazendo cozinha portuguesa e internacional, seguindo-se, na sexta-feira, Leonor Manita com cozinha asiática contemporânea. No sábado, Dima e Mali apresentam a "cozinha bombástica do Médio Oriente". Na quinta-feira da outra semana, dia 26, a iniciativa prossegue com Imi Bodo e a cozinha da Roménia, no dia 27 com Viriato Pã com "cozinha africana mundana", para terminar a 28 com cozinha tradicional do Bangla Desh com MD Nizam. Os jantares custam 15 euros por pessoa e as reservas, limitadas a 40 lugares, fazem-se através do e-mail cozinhasdomundo.reservas@gmail.com. Mais informações no Facebook da Cozinha Popular da Mouraria.

 

Segundo nos disse Adriana Freire, "a ideia é fazer o festival todos os anos, envolvendo cada vez mais a população local, tendo sempre a Cozinha Popular como ponto de partida". Este projecto tem tido, de acordo com a responsável, uma grande aceitação por parte dos habitantes da zona, o que é "o mais importante", ajudando a dar a conhecer melhor um ponto da cidade que continua bastante desconhecido, mesmo para os lisboetas. "Não queremos apenas usar a Mouraria como cenário, queremos que as pessoas participem e não há outro bairro em Lisboa que apresente tantos aspectos multiculturais. E na cozinha também. Por isso, faz todo o sentido que um festival como este seja aqui", conclui.


Antoine Westermann sai, Vincent Farges fica

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Desde o início deste mês, o chefe francês Antoine Westermann deixou de ser consultor da Fortaleza do Guincho, deixando a Vincent Farges (na foto), há mais de oito anos à frente do restaurante, a tarefa de dar continuidade ao excelente trabalho que ali se vem realizando. Foram mais de 15 anos de consultoria de Westermann e o saldo dificilmente poderia ser mais positivo, tal a influência que este restaurante, insuficientemente galardoado com apenas uma estrela Michelin, teve na nossa evolução gastronómica. Primeiro com Marc Le Ouedec, depois com Farges, a Fortaleza do Guincho tem sido uma verdadeira escola para os cozinheiros portugueses que por ali passaram e um exemplo de rigor e profissionalismo, que aliás se estende à equipa da sala. Com a saída do chefe consultor alsaciano, haverá algumas modificações no menu, nomeadamente em alguns pratos clássicos da sua cozinha, mas certamente que Vincent Farges, um dos melhores profissionais a trabalhar em Portugal, estará mais à vontade para implantar o seu próprio estilo, que seguramente passará pela utilização dos nossos produtos da terra e do mar, de que é um profundo conhecedor. E, quem sabe, talvez venha finalmente a segunda estrela, já que os inspectores da Michelin dão especial valor à personalidade de um chefe que desenvolve a sua própria cozinha. Pessoal e profissionalmente, ficam os meus agradecimentos a Antoine Westermann, um grande chefe que me proporcionou inúmeros e inesquecíveis momentos de enorme satisfação e de aprendizagem.

 

Foto: Câmara Municipal de Cascais

Restaurante Palco (Hotel Teatro - Porto)

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 Uma encenação de bom nível

 

 

O empregado aproxima-se da nossa mesa e, sob uma luz que lhe deixa parte do rosto na penumbra, dá as boas noites e inicia a explicação do menu. Estando num restaurante de nome “Palco”, que por sua vez, faz parte de um hotel de nome “Teatro”, fico na dúvida se o monólogo é encenado. Talvez não. O empregado é simpático, embora um pouco tímido até, e lá continua, com a sua voz pausada e ligeiramente colocada. Ficamos a saber que o menu Palco (65€) comporta 7 pratos e que o pairing com vinhos tem um extra de 25€. Já o menu “Almeida Garret” (44€) inclui menos dois pratos e, acompanhá-lo com vinho, acresce em 17€. Todos estes pratos podem ser pedidos individualmente, à carta (com preços entre 13€ e 25€), tal como as sobremesas (entre 6€ e 9€).
 
Ficamos ainda a saber que, além do anunciado, existe, ao almoço, uma carta mais económica composta por “pequenos cenários”. Em ambos os casos a matriz de base é portuguesa, com influências internacionais, sendo que à noite é mas visível a criatividade do jovem chefe Arnaldo Azevedo. Por sua vez a carta de almoço segue uma vertente mais petisqueira, ainda que com um toque autoral.
 
A casa está composta e reina um ambiente descontraído, muito diferente da frieza que muitas vezes associamos a restaurantes em unidades hoteleiras. É verdade que o Hotel Teatro tem uma atmosfera muito própria e a decoração contemporânea da sala é quente e particularmente feliz. Resumindo: o Palco é um restaurante onde apetece ir e ficar. Mas será só pelo ambiente?
 
Aspecto da sala principal do Palco 
Era a segunda vez que ali estava. A primeira aconteceu um ano antes num jantar harmonizado com vinhos da Madeira (de mesa e generosos). Na altura fiquei agradavelmente surpreendido com as respostas do chefe a uma panóplia de vinhos nem sempre fáceis - uns porque eram bons de mais, outros porque nem tanto.
 
Arnaldo Azevedo ainda não chegou aos 30 anos mas revela uma grande segurança ao nível da execução, para a qual deve ter contribuído, certamente, a sua passagem pelo extinto restaurante Amadeus (do chefe austríaco Siegfried Danler Heinemann), em Almancil, na altura com uma estrela Michelin. Notei essa solidez na altura, no jantar com vinhos da Madeira, e, também agora, nesta refeição mais recente. Em termos criativos nota-se que Azevedo está atento ao que se passa no mundo da cozinha contemporânea e faz bem a síntese, no prato, com os conhecimentos que adquiriu e com as vivências e a cultura onde se insere. Contudo fica a sensação que possui qualidades para ir mais longe, assim tenha condições para o fazer. Há propostas nos menus, nomeadamente no que escolhemos, o “Almeida Garret”, que estão lá como os ‘hits’ nos álbuns de músicos interessantes. Servem para o prazer imediato, sem ter de se pensar muito. Outras, como o pato das Landes, por exemplo, são de um refinamento e de um apuro técnico admirável.
O jantar começou com uns amuse bouche muito valorizados não só pelo sabor, mas igualmente pelos recipientes de aço e madeira em que foram servidos. O primeiro era um cannoli de creme de queijo e camarão, com um toque de caril; o segundo, um cone de salmão fumado com espuma funcho. Para finalizar, dois croquetes envolvidos em panko, um de alheira e queijo da serra (com um toque de aipo) e o outro, de morcela da beira.
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vieira com puré de couve flor
tamboril, risotto de lavagante e espargos brancos
Palato entretido, beliscadela no pão (demasiado banal para estar ali) e chegou o primeiro prato: vieira com puré de couve flor (e que vem habitualmente com barriga de atum rabilho, mas que nesse dia não havia). A vieira estimula a gula de qualquer um. Bem corada, ligeiramente crua no meio e conjugada com couve flor, até uma criança de apetite difícil pede por mais – mesmo que deixe de lado o coração de tomate, o toque de mestre que aporta a acidez certa ao conjunto. É um dos ‘hits’ que falava. Outro, ainda que em parte, veio logo de seguida. Refiro-me ao “tamboril, risotto de lavagante e espargos brancos”, servidos numa cataplana: o tamboril e os espargos de um lado, o risotto do outro. Ambos muito bem feitos e saborosos. Porém, para dizer a verdade, não encontrei uma ligação evidente entre os dois, nem sinais de terem sido confeccionados na cataplana, ou pelo o seu método. O risotto (o ‘hit’) parece estar lá para dar substância, mas, na realidade, mais parece um outro prato. O que, para ser concreto, acaba por ser um bónus - dir-me-ão alguns, mais adeptos da substância do que do conceito.
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 terrina de rabo de vitela e de foie gras com cantarelos
peito de pato, cenoura com especiarias, gnocchis e beterraba
Belíssima, a proposta seguinte, uma espécie de terrina de rabo de vitela e de foie gras com cantarelos (cogumelos) e pão torrado no topo. Impressiona mesmo, o paladar do rabo de boi, com o foie a dar um toque distinto e uma maior extensão de sabores. Contudo, o prato da noite foi mesmo “peito de pato, cenoura com especiarias, gnocchis e beterraba”. Primeiro, pela qualidade dos produtos: do peito de pato das “Landes” e dos legumes. Depois, pela execução irrepreensível: o pato no ponto rosado e pele bem tostada, como mandam as regras; o gnocchi  guloso (mas não gorduroso) e os legumes entre o cru laminado e o cozido ‘al dente’. Tudo conjugado por sobreposição, com uma ou outra nota contrastante. Sem dúvidas um prato de primeiríssima água - mais um ‘gnocchi’ e ia buscar um inspector da Michelin por uma orelha.
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“a janela do meu quarto”
A entrada no capítulo doceiro fez-se com um elegante conjunto de frutos vermelhos e yuzu, com uma infusão fria de notas cítricas. Quem liga aos detalhes vai gostar muito desta passagem. Talvez mais até do que da própria sobremesa prosaicamente descrita como, um semi-fio de queijo fresco com manga e maracujá e frutos secos em vinagre balsâmico.
 
Em relação aos vinhos, a carta não é extensa mas entre as cinquenta referências de vinhos de mesa, das quais metade disponibilizadas a copo, há um pouco de tudo e – eis a boa notícia – a preços muito convidativos. Só para dar o exemplo, refira-se o caso dos espumosos: uma flute de champanhe Taittinger brut custa 6.50€ e, no caso dos espumantes nacionais disponíveis, fica em 4.5€. A refeição descrita foi acompanhada pelo alvarinho da região dos Vinhos Verdes, Soalheiro 2012, que mostrou a sua versatilidade com os pratos mais ligados ao mar. Com o rabo de boi e com o pato escolhemos o clássico Vinha Grande 2010, um tinto duriense da Sogrape que tão bem tem resistido a modas e tendências.
Por último, o serviço foi amável e competente, ainda que com alguma demora entre pratos. O monólogo do inicio não se repetiu no final, pelo que saímos de cena logo que cerrou a cortina (leia-se: assim que pagámos). E saímos satisfeitos com a nossa refeição em vários actos, com o ambiente e, não menos importante, por ficarmos com a noção que embora seja bem vinda um pouco mais de ousadia, temos chefe. Que o espectáculo continue neste Palco, portanto. 
 
Preço médio (entrada, prato, sobremesa e vinho): 20€ (almoço); 40€ (jantar). Pela refeição descrita, com água e café pagou-se 60 euros.
 
Contactos: Morada: R. de Sá da Bandeira 84, Porto, Telef: (+351) 220 409 620
Horário: Segunda a domingo, das 12:30 às 15:00 e das 19:30 às 22:30.
 
Classificação:
Cozinha: 17,5 ; Sala: 17; vinhos: 17

 

Texto publicado originalmente na revista Wine nº84 (Maio 14)

O Assinatura faz 4 anos

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 Foto: Mário Cerdeira

 

Faz hoje 4 anos nascia em Lisboa o Assinatura. Com uma ligação forte ao seu sócio e chefe fundador, Henrique Mouro, o Assinatura assumiu-se desde o inicio como um restaurante de fine dining em que modernidade e tradição se cruzavam, à imagem da cozinha do seu autor (pode ler aqui a crítica que escrevi no inicio de 2011). Contudo o último ano e meio não foi um período fácil para este espaço, próximo do Marquês de Pombal.

 

Por questões de saúde Henrique Mouro esteve algum tempo ausente e viria mesmo a sair em Junho do ano passado. Para o seu lugar chegou João Sá, que sairia, também, 9 meses depois, para dar lugar a Vítor Areias, até então seu sub chefe. Com Areias, um jovem com potencialidade e conhecimento (quer teórico, quer prático, como assinalou aqui o Duarte Calvão), o restaurante tem prosseguido com o mesmo conceito, de cozinha de autor e de Tradição/modernidade, como pôde constatar quem passou pelo Peixe em Lisboa ou, como é visível aqui, com o mais recente menu.

 

A propósito: para celebrar a efeméride este menu pode ser degustado a um preço especial, até 5 de Julho. Isto para quem for assinante do site. Neste período, 4 pratos custarão 30€, em vez dos habituais 47€ e, ao almoço, entrada, prato, bebida e café ficará em 20€ - também apenas para assinantes. 

 

Uma nota final para assinalar algo que me parece incompreensível: o facto de não ter havido qualquer intervenção (pelo menos) na sala desde a saida de Henrique Mouro. É verdade que se um restaurante fosse alterar tudo sempre que muda de chefe, o que não faltaria era emprego para decoradores, arquitectos e empreiteiros. Contudo, tendo uma ligação tão forte ao seu chefe fundador, nomeadamente na decoração personalizada, parece-me que a manutenção de tudo (ou quase tudo) como sempre esteve é/foi um peso demasiado pesado (passe a redundância) para qualquer um dos jovens chefes que assumiram posteriormente o cargo. Dar uma "lavagem de cara" ao espaço, para não falar numa remodelação profunda - mais complicada, pelo investimento que requer - é algo que deveria ser considerado. Digo eu. Para benefício de que está e para quem chega: é importante que se saiba que houve mudanças.

 

Contacto:

Rua do Vale de Pereiro, 19, 1250-270 Lisboa
21 386 7696

 

 

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João Sá deixa Assinatura e Vítor Areias assume chefia

Assinatura: sai Henrique Mouro, entra João Sá

 

 

 

Pedro e o Lobo acaba, surge o Abc

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Aimé Barroyer desistiu do projecto e agora, no lugar do Pedro e o Lobo, surge o Abc, tendo como chefe Marta Simões, cujo currículo não foi divulgado. Parece que querem fazer "uma cozinha portuguesa, confortável e sem pretensões". Num "ambiente descontraído e convidativo", quer ser um "restaurante de origens, feito de memórias e ideias simples", cuja única missão é fazer com que o cliente "se sinta como em sua própria casa". Propõe-se, ainda de acordo com o comunicado, "satisfazer apetites, menos ou mais vorazes, mas absolutamente honesto, com boa comida, ingredientes sempre frescos, comprados com critério, e preços à medida de todas as bolsas". Segundo dizem, "Lisboa já merecia um restaurante assim!". Fecha ao domingo.

 

Nota: fotografia escolhida ao calhas na Internet

 

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Aimé Barroyer no Pedro e o Lobo

Uma Cozinha com Assinatura

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Há um exercício que gosto de fazer. Algum tempo depois de uma refeição pensar em qual foi o prato que me ficou na memória. Relativamente a um jantar recente no Assinatura, não tenho que pensar muito, a entrada foi marcante! Creme de queijo de cabra fumado com feijão branco, cerejas, sumo de cereja e ervas aromáticas. O primeiro impacto era o da riqueza cromática do prato. Depois, quando se comia, isso era complementado com a percepção da textura. A densa cremosidade do queijo de cabra, que contrastava com a firmeza das carnudas cerejas. O sabor levemente fumado do queijo, suavizado com o feijão branco, o aroma a benzaldeído da cereja (também responsável pelo aroma característico da amêndoa) e depois uma explosão muito intensa de frescura, cujas características iam variando de colherada em colherada, conferida pela grande variedade de ervas aromáticas. Absolutamente delicioso… e brilhante!

Logo a seguir, salta-me à memória o primeiro componente do amuse-bouche, choco desidratado com ouriço do mar e salicórnia. Uma dose pequena, mas quando se metia na boca a riqueza de sabores e a explosão de umami  agigantavam-na.

Conheço o trabalho do Vitor Areias, conheço também a seriedade e a profundidade com que aborda cada aspecto dele. Tem referências e experiência de trabalho em restaurantes como o Mugaritz e o Noma, que influenciam a sua cozinha, sem a marcar em excesso. Um cozinheiro que tem uma linha de trabalho bem definida e que pode dar que falar se tiver oportunidade de evoluir. Tudo isto se revela no que está a fazer no Assinatura, apesar de ainda estar à frente do restaurante há bem pouco tempo e ter começado com toda uma nova equipa.  As referências ao seu trabalho têm sido muito positivas (um exemplo, e outro, e mais outro) e tive oportunidade de o confirmar em duas refeições de que tenho que destacar  a qualidade do que comi e também a originalidade das propostas.

Choco com ouriço e salicórnia, xaputa e a sua glândula com mini alho francês e rabinho de porco (bem crocante… e como despertou a minhas memórias gastronómicas mais profundas…)

Tamboril, pimentão caseiro, caldo de bivalves, ervilhas de quebrar (com um sabor bem fresco e uma textura crocante) e rebentos de ervilhas

Barriga de leitão com molho de demi-glace e salada de bivalves

Gosto particularmente dos limpa palato que o Vitor serve, neste jantar um shot de granizado de hortelã com uma espuma quente de limão, muito aromático! Numa visita anterior tinha comido uma versão com poejo, também muito boa.

Finalmente, uma sobremesa de encher o olho, um pudim inspirado no pudim Abade de Priscos, mas mais leve, submersa numa espuma de vinho do Porto. Lindo, o pudim muito bom e na dose certa, a espuma, quanto a mim, ainda a precisar de algum trabalho que a torne tão boa quanto bonita. (Mas não me fez esquecer o leite creme de aipo do Peixe em Lisboa – a que eu, que nem gosto muito de aipo, fiquei rendida pelo seu sabor invulgar e sofisticado).

 

Parabéns ao Assinatura pelo 4º aniversário. Parabéns ao Vitor Areias e à sua equipa.
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