A Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira (Matosinhos), era um dos espaços que queria conhecer há muito tempo por se tratar de uma das obras iniciais (e das mais emblemáticas) do arquitecto Siza Vieira. Projectado na década de 50 e classificado em 2011 como Monumento Nacional, este lugar foi recuperado recentemente e concessionado ao conhecido chef nortenho Rui Paula, que ficou responsável pela montagem da cozinha e adaptação a restaurante de luxo com pretensões assumidas a estrela Michelin.
Rui Paula não se poupou a esforços e soube dignificar o lugar, imprimindo uma marca de classe e elegância na apresentação (mobiliário, atoalhados, loiças, etc) e uma proposta de cozinha clássica contemporânea de acordo com esses pressupostos e com a envolvente ligada ao mar, à região e a Portugal.
A parada deste lugar é alta e está definida nos seguintes termos: a carta inclui apenas 3 pratos clássicos do chefe, todos de peixe/marisco, com o mesmo preço (80€) e para duas pessoas. Depois há 3 menus: o "Boa Nova", de 4 pratos (85€ + 40€ se for harmonizado com vinhos) e os menus "do mar e da terra", e "Atlântico", ambos de 8 pratos (120€ + 75€, com harmonização). Qualquer um dos 3 menus inclui ainda uma série de snacks (amuse bouche).
carabineiro, três texturas de ervilhas e ovo de codorniz
robalo no seu habitat (com bivalves, e algas) e salsify
pescada de anzol, plâncton e percebes
(pormenor do prato de pescada depois de estropiado)
o bacalhau: lombo, bochecha (com topping de sapateira), língua e feijoada de sames
"arroz de lula" (lula, arroz tufado e bolho bordalês)
os cítricos e o "ivoire"
Como se percebe pelas fotos optei pelo menu Atlântico, onde o produto do mar tem primazia. Adorei a pescada, um produto ignorado a sul, e que aqui, tal como em Espanha, o chefe sabe valorizar tão bem. Foi o prato que mais me marcou, com os percebes, a fina lâmina de lírio (peixe) no topo e, sobretudo, o plâncton (que estalo!) a valorizarem o conjunto. Gostei muito, também, do carabineiro e da ligação com as ervilhas - as primeiras da época - tal como da lula "das riscas" que já tinha provado num evento do Vila Vita / Ocean em que Rui Paula esteve presente. Os exemplos referidos foram de pratos de grande carácter. Contudo, há alguns pormenores que, a meu ver, podiam melhorar. Por exemplo, os sabores de algumas propostas podiam ser mais puxados: na feijoada de sames (do prato de bacalhau) ou de uma ou outra proposta, como a ostra, ou a parte do tentáculo de polvo, que não expressavam tudo o que podiam.
Resumindo, no cômputo geral foi um almoço de grande nível, num espaço espaço muito especial. Uma refeição que foi acompanhada de um bom conjunto de vinhos - uma área que sempre foi bem trabalhada nos restaurantes de Rui Paula - e dos quais destaco este Arinto dos Açores, da Azores Wine Company, um dos brancos surpreendentes que António Maçanita tem vindo a fazer na ilha do Pico.