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Duas ou três coisas sobre os resultados do Guia Michelin 2017

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Este ano fez-se história em Girona: nunca o mais influente e prestigiado guia gastronómico do mundo tinha atribuído tantas estrelas a Portugal (ou a Espanha). Foram 9 os galardoados, ou seja: de uma assentada passámos de 3 para 5 no número de restaurantes com duas estrelas, e de 11 para 18, nos de uma estrela.

 

Para termos uma ideia do que estes resultados representam refira-se que quase equivalem ao saldo das novidades (em termos de estrelas) dos últimos sete anos. Senão vejamos:

 

2010: Ocean e Tavares ganham 1 uma estrela.

2011: apenas uma única notícia e desagradável: Eleven perde o galardão.

2012: 2 estrelas para o Ocean e 1 para o Feitoria e Yeatman. Porém, o Amadeus (Almancil) perde a sua.

2013: a primeira estrela do Belcanto

2014: L’and, Eleven ganham uma e São Gabriel perde a sua

2015: Belcanto ganha a segunda, São Gabriel recupera a perdida e Pedro Lemos estreia-se na comenda

2016: O algarvio Bon Bon, ganha a primeira estrela, mas o L'And, perde a conquistada em dois anos antes

 

(nota: os guias têm sido apresentados sempre em Novembro do ano anterior à data de capa)

 

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Os chefes de Portugal presentes em Girona. Da esquerda para a direita: Hans Neuner (Ocean), Rui Paula (Casa de Chá da Boa Nova) Ricardo Costa ( Yeatman ), Luis Pestana (William), Vítor Matos (Antiqvm), Benoit Sinthon, (Il Gallo d'Oro), Miguel Laffan (L'And), Henrique Sá Pessoa (Alma), Alexandre Silva (Loco), Dieter Koschina (Vila Joya), David Jesus e José Avillez (Belcanto).

 

Porém, ainda que os resultados tenham sido fantásticos foi irritante saber, no dia da cerimónia, pelas 18h, que Michael Ellis o director do guia tinha referido à TVI que Portugal iria receber nessa noite 7 novas “1 estrela” e 2 novos “2 estrelas”. Fiquei incrédulo porque umas semanas antes o director de comunicação da publicação, Ángel Pardo, tinha referido num encontro em Madrid, que Portugal iria duplicar o número de estrelas, notícia que me confirmaria, depois, por telefone (e posteriormente a outros jornalistas portugueses). Duplicar significaria 17 novas estrelas, bem diferente das novas 9 (ou 11, conforme se queira contabilizar os que passaram de uma a duas estrelas) que acabariam por ser atribuídas. Durante a cerimónia questionei Ángel Pardo em relação ao sucedido e verifiquei que ele não se tinha apercebido desta diferença. Apanhado de surpresa com a pergunta foi honesto e depois de ter tentado esboçar uma justificação admitiu que só poderia ter sido um erro de percepção seu.

 

Já ouvi dizer que os inspectores teriam ficado irritados com a comunicação antecipada e teriam reduzido o número de estrelas para Portugal, mas como não sou muito dado a teorias da conspiração não vou na conversa. Também há quem diga que referiram que Espanha iria ter um novo 3 estrelas fora de uma cidade grande, quando na verdade o restaurante que ganhou, o Lasarte, situa-se em Barcelona. Enfim...

 

Tenha sido por negligência (por não terem uma verdadeira noção do número de estrelas que havia em Portugal), ou por dificuldades na matemática o que é certo é que a gaffe acabaria por criar expectativas e ansiedade um pouco por todo o país.

 

Lembro-me de confessar ao Duarte que tinha tido dificuldades em listar um número tão elevado de restaurantes a quem poderia sair a taluda (algo que ainda assim o fizemos aqui e aqui). Não porque não houvesse um conjunto de lugares que o merecesse, mas porque esse grupo teria de incluir alguns projectos que, para os padrões do guia, não me pareciam ter ainda a consistência ou experiência necessária para receber a comenda, ainda para mais dado que Ángel Pardo me garantiu que a Michelin não facilitou nos critérios, mas sim que tinham sido os restaurantes portugueses a atingir o patamar por eles exigido.

 

A verdade é que quando foram revelados os contemplados deu para verificar que quase todos eles acabam por assentar nos critérios fétiches do guia. Ou seja: mais formais ou um pouco menos formais, com toalhas ou sem toalhas nas mesas, todos encaixam minimamente no padrão do restaurante de fine dining. Depois, no caso de alguns vencedores, os seus chefes principais têm ou já tinham tido estrelas em outros lugares, como era o caso do William (Joachim Koerper), Antiqvm (Vitor Matos), ou Lab by Arola. 

 

Feliz surpresa, para mim, na lista anunciada, foi a presença do Loco, dado o restaurante ter menos de um ano, Alexandre Silva nunca ter ganho antes uma estrela e pelo facto da proposta do lugar ser menos convencional (menos do que o Alma, por exemplo). O segundo caso que me surpreendeu foi o do L’And, simplesmente por não ser comum a Michelin voltar a dar uma estrela apenas um ano depois de a ter retirado.

 

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Benoit Sinthon e Ricardo Costa, segundos antes de receberem a boa nova

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Rui Paula e Henrique Sá Pessoa, dois chefes felizes que há muito desejavam a tão ambicionada estrela

 

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"Queridos, ganhámos uma estrela!", parece dizer Alexandre Silva, do Loco, com a sua nova jaleca "estrelada".

 

Houve restaurantes que ficaram de fora que mereciam ter estado em Girona. O caso mais gritante talvez seja o do Kanazawa, que parece nem ter recebido a visita dos inspectores, o que a confirmar-se não seixa de ser inexplicável. Aliás, no guia não consta nenhum japonês de Lisboa (ao contrário de Madrid, por exemplo, que tem dez, dois dos quais com estrela). Já quanto à ausência do Vista (do Hotel Belavista, Portimão) de João Oliveira, ou do restaurante do Esporão, de Pedro Pena Bastos, que estiveram sob a alçada do guia, creio que chegarão lá mais cedo ou mais tarde. Aliás, estou convicto que se continuar a fazer um trabalho com a qualidade do que actualmente apresenta, Pedro Pena Bastos, de 25 anos, será o mais jovem chefe português a receber uma estrela.

 

Fala-se novamente na possibilidade da cerimónia do guia vermelho, que cada vez desperta mais atenção, vir para Lisboa. Oiço essa intenção desde 2011 ou 2012, mas, ao que consta outras regiões de Espanha chegaram-se à frente com o cheque. Desta vez, a presença em Girona da Secretária de Estado do Turismo Ana Mendes Godinho, confirmou oficialmente esse interesse, pelo que as probabilidades parecem maiores do que nunca. A confirmar-se acho que pode ser bom para o nosso país. Porém, é preciso fazer mais do que tem sido feito. Nomeadamente a necessidade de “prender” cá os jornalistas espanhóis por mais tempo e dar-lhes condições básicas, como, por exemplo, a disponibilidade de wi-fi, algo que nos foi negligenciado em Girona. Além disso, também espero que ao contrário do que tem acontecido, as informações no local ou nas peças de promoção incluam as duas línguas (e não apenas o espanhol) e que o capítulo português do guia, em si, deixe de ter erros grosseiros de tradução e de edição.

 

Posto isto, volto ao inicio para congratular os contemplados (e não me refiro apenas aos novos) e a todos os profissionais que neles trabalham. Este foi o ano da afirmação de Portugal no Guia Michelin. Aliás, em termos proporcionais, os resultados obtidos foram mesmo superiores ao de Espanha, o que não deixa de ser elucidativo do bom momento que atravessa a nossa cozinha de autor.

 

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